Duas baleias-de-bico marcadas com sensores ao largo da Ilha Terceira estão a ajudar os cientistas a compreenderem melhor as estratégias de caça destes mamíferos tímidos e difíceis de observar.
O mar dos Açores é um habitat muito procurado por várias espécies de baleias-de-bico, assim chamadas devido ao bico que têm, que lhes dá uma aparência parecida com a dos golfinhos. Dentro dos 21 membros desta família, que pertence ao grupo dos Odontocetos (cetáceos com dentes), as mais comuns são as do género Mesoplodon ou mesoplodontes – baleias que medem entre quatro a seis metros de comprimento, cujo corpo se assemelha a um fuso, e que são conhecidas por caçarem a grandes profundidades.
Mas os cientistas pouco mais sabem sobre as 16 espécies de mesoplodontes hoje conhecidas, uma vez que são tímidas e raramente avistadas à superfície. Assume-se por exemplo que “usam a ecolocalização para caçar peixes relativamente pequenos, lulas e crustáceos”, descreve uma equipa de investigadores liderada por Fleur Visser, da Universidade de Amesterdão, que publicou agora um estudo no Journal of Experimental Biology sobre o comportamento destes animais.
Na tentativa de saberem mais sobre este grupo de mamíferos marinhos, estes cientistas conseguiram marcar duas baleias-de-bico-de-sowerby (Mesoplodon bidens) junto à Ilha Terceira recorrendo a ‘biologging’, em que os animais são marcados com pequenos sensores electrónicos que medem valores ambientais e fisiológicos. Os aparelhos ficaram presos ao dorso das duas baleias com a ajuda de ventosas e desprenderam-se passadas poucas horas, sendo recuperados no mar.
“Os aparelhos registaram informação detalhada sobre os mergulhos, movimentos e estratégias de ecolocalização destes animais extremamente tímidos, o que providenciou a primeira oportunidade para se investigar o seu comportamento alimentar”, descreve uma nota de imprensa da Universidade de Amesterdão.
A informação assim obtida, o que aconteceu pela primeira vez para as baleias-de-bico-de-sowerby, foi depois comparada com os dados já conhecidos de outra baleia muito semelhante, mas mais comum e bastante mais escrutinada: a baleia-de-bico-de-blainville (Mesoplodon densirostris).
Desta forma, a equipa tentou perceber se as estratégias de caça usadas por ambas são ou não diferentes. Ou seja, “até que ponto [estas duas espécies] conseguem evitar competirem entre si pelas mesmas presas”, explica a nota de imprensa.
No que respeita à baleia-de-bico-de-blainville, esta é conhecida por mergulhar a grandes profundidades em busca das suas presas, movendo-se muito devagar de forma a conservar energia – uma característica que se considera ser comum aos outros mesoplodontes. No entanto, a baleia-de-bico-de-sowerby, descobriram agora os investigadores, “difere fortemente” de outras baleias do mesmo grupo na forma como nada e captura outros animais.
“Quando perseguem a uma profundidade semelhante (entre 800 a 1.300 metros), nadam consistentemente mais depressa, realizam mergulhos profundos mais curtos e ecolocalizam a uma velocidade mais rápida, com ‘cliques’ em frequências mais elevadas”, nota a equipa.
“Este primeiro registo de uma baleia-de-bico ‘rápida’ sugere que as baleias mesoplodontes exploram uma maior diversidade de nichos no mar profundo do que suspeitávamos”, conclui a Universidade de Amesterdão, sobre os resultados obtidos com as duas baleias-de-bico no mar dos Açores. “O mar profundo é um território de caça rico e diverso para os mamíferos marinhos predadores, que desenvolveram claramente um leque de estratégias mais especializadas para o conseguirem explorar do que era conhecido até agora”, admitem estes cientistas.