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Aves aquáticas podem estar a dispersar fungo que dizima anfíbios em todo o mundo

30.03.2017

As aves aquáticas poderão estar por detrás da dispersão do fungo que está a dizimar as populações de anfíbios em todo o mundo. O papel das aves aquáticas como vectores de doenças foi demonstrado nos Andes bolivianos por investigadores do Museu Nacional espanhol de Ciências Naturais (MNCN-CSIC), em Madrid, e da Universidade de Puerto Rico.

 

A quitridiomicose, causada pelo fungo microscópico Batrachochytrium dendrobatidis, é uma doença que está a dizimar populações de anfíbios na América Central, Austrália, Estados Unidos, Europa e África oriental. Em 2015 chegou a Madagáscar, país que, com mais de 500 espécies de anfíbios, alberga 7% das espécies de anfíbios do planeta, a maioria das quais não existe em mais lugar nenhum do mundo.

Portugal não é excepção. Em 2009 foram encontradas centenas de sapos-parteiro (Alytes obstetricans) mortos numa das lagoas do Parque Natural da Serra da Estrela. Os investigadores concluíram tratar-se de uma infecção por aquele fungo. Em poucos anos, o sapo-parteiro desapareceu de quase 70% dos pontos onde habitava. Este foi o primeiro caso de declínio de anfíbios em Portugal associado a uma doença.

O fungo foi registado, pela primeira vez, na década de 90. De então para cá já foi detectado em mais de 500 espécies de anfíbios em todo o mundo. Destas, pelo menos 200 já sofreram um declínio por causa da infecção.

Num artigo publicado agora na revista científica Journal of Wildlife Diseases, uma equipa de investigadores acredita ter conseguido avanços no conhecimento sobre esta doença.

Os investigadores centraram-se na Bolívia e procuraram a presença do patogénico analisando tecidos das patas das aves aquáticas andinas, capturadas entre 1977 e 1997, período durante o qual começou a alta incidência da doença na região. “Graças às colecções de História Natural pudemos escolher 48 exemplares de aves. Recolhemos amostras do tecido das patas e, utilizando técnicas de amplificação e sequenciação de ADN, pudemos confirmar a presença do fungo em quase metade delas”, explica o investigador do MNCN, Ignacio De la Riva, em comunicado.

 

Vista de parte dos Andes bolivianos e um exemplar de rã gigante do lago Titicaca, Telmatobius culeus, espécie na qual se detectou a doença pela primeira vez. Foto: Ignacio De la Riva

 

“Que as aves possam ser portadoras do fungo, explicaria o padrão de propagação, errático e a saltos, da doença entre os anfíbios andinos”, continuou Patricia Burrowes, uma das investigadoras que participou no estudo.

O desenvolvimento da doença

Num outro trabalho complementar, publicado agora na revista científica Biological Invasions, a mesma equipa estudou os padrões geográficos e taxonómicos da presença da doença nos Andes bolivianos. Neste caso foram colhidas amostras de tecido de rãs, guardas nas colecções de nove museus desde 1863 a 2005, além de exemplares capturados na natureza entre 2009 e 2016. Assim puderam encontrar o registo mais antigo que se conhece desta doença em todo o mundo, numa rã gigante do lago Titicaca, capturada em 1863 e trazida para o MNCN pela Comissão Científica do Pacífico.

Os investigadores sugerem que ao longo da história pode ter havido diferentes estirpes. “Por um lado, esta presença antiga parece dever-se a uma estirpe endémica, e por outro, temos uma infecção mais recente que provém de uma estirpe mais virulenta que surgiu na década de 90 e que coincide com o recuo drástico das populações de anfíbios que temos vindo a registar na Bolívia”, terminam os investigadores.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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