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Marta Cabaça: “fiquei surpreendida por saber que o lince me dá pelo joelho”

20.04.2016

Marta Cabaça, 28 anos e natural de Lisboa, é vídeo-vigilante no CNRLI desde Fevereiro de 2016.

 

Desde sempre que Marta soube que iria trabalhar com animais. Esta certeza ficava mais forte sempre que via documentários de vida selvagem aos fins-de-semana na televisão. Tirou Biologia e interessou-se pelo comportamento animal para saber por que os animais fazem o que fazem e como fazem.

No Verão de 2015 estava desempregada. “Como sempre tive um grande interesse por conservação e paixão por animais, felinos em particular, decidi candidatar-me ao centro como voluntária. Felizmente fui aceite. Gostei tanto que pedi para ficar mais três meses, até final de Janeiro. Nessa altura surgiu uma oportunidade de integrar a equipa de etologia, enquanto vídeo-vigilante contratada, a qual eu aceitei com extrema felicidade.”

 

 

Marta está no Centro Nacional de Reprodução de Lince-ibérico (CNRLI), em Silves, para conhecer melhor “o nosso gato” e tentar ajudá-lo a regressar ao seu habitat natural. “Como dizer não a esta oportunidade? Impossível, diria eu.”

Antes de vir, Marta tinha a lição na ponta da língua. “Sabia que é um felino em perigo de extinção, que está ameaçado pela fragmentação de habitat, aumento da presença humana, furtivismo e diminuição das populações de coelho-bravo.”

Mas ainda assim deixou-se surpreender por este felino das barbas. “A primeira coisa que mais me surpreendeu quando aqui cheguei foi o tamanho do animal. Devo dizer que tinha imaginado um felino bem maior. Fiquei genuinamente surpreendida quando tive oportunidade de ver um lince ao vivo aqui no centro e perceber que é um animal que em altura nos dá pelo joelho. Atenção, não é por isso que lhe tenho menos respeito mas admito que, devido à minha admiração pelo animal, tinha imaginado um Golias.”

E também não estava à espera de que o lince-ibérico fosse, afinal, tão parecido ao seu próprio gato. “Ainda agora tenho momentos em que vejo um lince fazer determinada coisa e pensar ‘olha, o meu gato faz isto’. Acho que quando contactamos com um animal que admiramos e não conhecemos estamos sempre à espera de algo fantástico e mirabolante. E de facto, os linces são isso mesmo, mas mais pela normalidade de comportamentos. Tal como os gatos, os linces gostam de brincar com bolas de cortiça, de se estender ao sol, de sítios altos e, se houver uma cama suspensa, maravilha!”

A parte melhor de ser vídeo-vigilante no CNRLI é “trabalhar e aprender com o lince-ibérico e com as pessoas que cá trabalham”. “Não tenho contacto directo com os animais mas ainda assim vigio-os oito horas por dia e isso permite-me aprender muito sobre os seus comportamentos e diferentes personalidades.” Também é um prazer acompanhar as crias desde que nascem, vê-las crescer e desenvolverem as suas personalidades, até ao momento em que são libertadas na natureza, diz.

“E claro, enche-me o peito de orgulho saber que tenho um papel activo na conservação do lince-ibérico, e que o estou a ajudar da maneira que posso. Porque quero mesmo que esta espécie prospere.”

Para Marta, o mais difícil são as situações que não pode controlar, por exemplo, a morte de uma cria ou de um lince atropelado ou envenenado. “Fico triste, mas também sei que haverá sempre situações fora do meu controlo e que tenho de me focar naquilo em que posso efectivamente ajudar.”

E depois há os horários… “Por vezes pode ser chato fazer turnos rotativos de oito horas. E obviamente que os animais não lhes interessa se é Páscoa, Natal ou feriado. Eles estão sempre cá e por consequência tu também. Mas sinceramente, para mim é o menos. Por eles é um ‘sacrifício’ que faço feliz.”

 

[divider type=”thick”]Série Como nasce um lince-ibérico
Uma equipa da Wilder esteve dois dias no CNRLI em Março do ano passado e assistiu ao último parto da temporada, ao lado de veterinários, tratadores, video-vigilantes e voluntários. Nesta série contamos-lhe como é o trabalho naquele centro e apresentamos-lhe as pessoas por detrás da reprodução em cativeiro desta espécie.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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