Joana Pechém, 34 anos e natural de Albufeira, é tratadora do CNRLI desde 2009.
Joana está no CNRLI desde 2009, o ano da inauguração. Ajudou a mobiliar os cercados para a chegada dos primeiros linces. Antes foi voluntária na Bolívia, num refúgio para animais selvagens resgatados, como papagaios, ocelotes e macacos-capuchinhos. Chegou a passear pumas com cordas, para melhorar a qualidade de vida dos animais.
Antes de começar a trabalhar no centro, o lince-ibérico era para Joana uma figura quase mística. “Sempre tive curiosidade pela espécie e conhecia a história da conservação. Lembro-me que coleccionava os recortes dos jornais com notícias sobre linces e gravava as notícias em cassetes VHS.”
O primeiro lince-ibérico que viu foi Morena. “Foi em Doñana (Andaluzia, Espanha). A Morena era um lince de 20 anos. Tinha um focinho assombroso e um rosto muito particular, com olhos grandes e barbas. Fiquei emocionada. Os seus olhos superaram as expectativas.” Uma vez surpreenderam-se uma à outra, no cercado. “Entrei no maneio e não a vi logo, meio escondida entre as ervas. E ela também não deu logo por mim, porque já ouvia mal. Quase esbarrámos uma na outra. Assustámo-nos as duas!”
Depois destes anos todos como tratadora, Joana aprendeu muitas coisas, entre elas que os linces são muito diferentes uns dos outros. “Procuro não entrar no mesmo espaço dos linces mais confiantes e agressivos, mas sei que posso entrar nos cercados dos linces mais ariscos e tranquilos. Por exemplo, já estive a limpar uma caixa parideira com a Bisnaga em cima da estrutura.” Muitas vezes a Esperança aproxima-se da rede quando a vê e foi o primeiro lince a dar-lhe “miminhos”.
Outra coisa que aprendeu foi que os linces podem ser menos solitários do que se pensava. “Tenho visto interacção em casais. Eles jogam às escondidas, mesmo os adultos. Os linces ronronam e ‘amassam’, como os gatos. E a Juromenha gosta de brincar com a água, como um cão. Mas quando se sentem ameaçados abrem as barbas e eriçam o pêlo. Às vezes dão patadas na rede e fazem grunhidos e bufidos e rosnam. Têm de estar confiantes no espaço deles. Não lhes impomos nada, nem há jogos de poder.”
Enquanto tratadora, Joana tem os seus momentos de felicidade plena. “Às vezes perco-me a observar algum comportamento curioso. Fico ali a observá-los. E os partos e as reintroduções na natureza são sempre momentos emocionantes.” Alguns dos momentos preferidos são quando alimenta os linces nas tardes de Verão, “quando estão mais tranquilos, mais confiantes e se aproximam mais. É muito gratificante.”
Mas é preciso criar barreiras. “É muito frustrante quando libertam um animal e ele morre no campo. Sinto raiva quando tudo acaba de forma tão absurda.”
Depois de tantas horas no CNRLI, será que trabalhar com linces se torna uma rotina? “De certa maneira, tendemos a olhar para ele como se fosse uma outra espécie qualquer. Mas o nosso compromisso é cuidar dos animais, dando sempre o nosso melhor.”
Para Joana, o lince-ibérico é um animal especial, carismático. “É uma espécie bandeira perfeita. Representa o mistério próprio da natureza. Acredito que é um embaixador. Ao investir nele estás a investir em todas as outras espécies que dependem do mesmo habitat. O lince é um impulsionador da mudança na conservação em geral. A história do mundo é feita destas coisas; leva tempo mas acredito que vamos chegar lá.”
[divider type=”thick”]Série “Como nasce um lince-ibérico”
Uma equipa da Wilder esteve dois dias no CNRLI em Março do ano passado e assistiu ao último parto da temporada, ao lado de veterinários, tratadores, video-vigilantes e voluntários. Nesta série contamos-lhe como é o trabalho naquele centro e apresentamos-lhe as pessoas por detrás da reprodução em cativeiro desta espécie.