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Abutre-preto. Foto: Bruno Berthemy/VCF

Abutre-preto: Este ano contaram-se mais de 108 casais nidificantes e 48 crias bem-sucedidas

26.11.2024

Os números agora divulgados pelo LIFE Aegypius Return, sobre a última época de reprodução do maior abutre da Europa, indicam que a espécie se está a expandir em território nacional.

A época de reprodução do abutre-preto, que em Portugal está hoje classificado como Em Perigo de extinção, terminou este ano com um total de 108 a 116 casais nidificantes contados de norte a sul do país pela equipa do projeto LIFE Aegypius Return (2023-2027), com o apoio do Instituto Nacional de Conservação das Florestas, da Rewilding Portugal e da Quercus.

Este aumento registado de casais de abutre-preto nidificantes, afirma numa nota de imprensa a equipa coordenada pela Fundação Para a Conservação dos Abutres (Vulture Conservatiob Foundation), “deve-se exclusivamente à natural expansão da espécie, resultado das medidas de conservação que têm vindo a ser aplicadas em projetos anteriores – como o LIFE Habitat Lince Abutre e o LIFE Rupis –, nas atuais ações do LIFE Aegypius Return e também graças a uma tímida, mas generalizada, melhoria nas condições do habitat e tranquilidade requeridas pela espécie”.

Infografia: VCF

Ainda assim, o facto de fazerem ninho não significa que todos estes casais cheguem a produzir ovos ou a conseguir cuidar das crias com sucesso até ao momento de saída dos ninhos. Contas feitas, este ano calcula-se que tenham sobrevivido 48 ou 49 crias que se juntaram à população deste abutre em Portugal, o que significa que “o sucesso reprodutor melhorou ligeiramente, de 0,47 em 2023 para 0,51 em 2024”, nota a equipa, que sublinha que desta forma
“foi atingido outro objetivo estratégico” do projeto LIFE Aegypius Return: que pelo menos metade das posturas resultem numa cria voadora”.

Mas apesar do otimismo, é necessária cautela, sublinham. “Qualquer ameaça significativa numa das colónias – que se mantêm relativamente pequenas e sujeitas a perturbação – pode comprometer esta tendência positiva e a sustentabilidade das populações.”

Abutres-pretos no ninho. Foto: Paulo Monteiro/SPEA

Dos cerca de 109 casais nifidicantes que em Agosto passado já tinham sido contados pela equipa – que tem vindo também a marcar muitas das crias com emissores GPS/GSM – o maior número encontra-se na colónia do Tejo Internacional, onde a espécie se voltou a reproduzir com dois casais em Portugal em 2010, após 40 anos de ausência.

Nesta área protegida colada à fronteira está o maior número de casais, com um total de 61 a 64 observados este ano – incluindo 15 a 16 que optaram pela margem espanhola do Tejo – que tiveram 24 a 25 crias que conseguiram sobreviver até começar a voar. Ou seja, o sucesso reprodutor mantém-se “relativamente baixo”, indica a equipa.

“A monitorização desta colónia transfronteiriça é particularmente difícil, pois, entre ninhos ocupados e ninhos antigos, são já mais de 160”, comentam. Destes, entretanto 12 ninhos foram oportunisticamente ocupados por casais de grifos (Gyps fulvus).

Os trabalhos estão a cargo da Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA) e contam com o apoio dos vigilantes do ICNF – Direção Regional do Centro e da Quercus. “Este ano, o apoio dos ‘Agentes del Medio Natural’ da Junta de Extremadura e da equipa do Parque Natural del Tajo Internacional, em Espanha, foi determinante para o resgate de crias de abutres-pretos em situações delicadas e ainda para a confirmação de alguns dados de monitorização”, explicam os responsáveis do projeto.

Na Herdade da Contenda, no concelho alentejano de Moura, que abriga a segunda maior colónia de Portugal, foram contados este ano 20 a 21 casais e um total de sete crias que resistiram às dificuldades dos primeiros meses. Nesta colónia transfronteiriça, cinco dos casais fizeram ninho no outro lado da fronteira, com uma das crias bem-sucedida na Contienda espanhola pela primeira vez.

Esta colónia é monitorizada pela Liga para a Protecção da Natureza (LPN), em cooperação com a Herdade da Contenda (empresa municipal) e o ICNF – DR Alentejo. “A articulação entre as equipas e autoridades portuguesas e espanholas tem sido fundamental para garantir a proteção e a tranquilidade das aves em todas as áreas ocupadas pelos abutres-pretos durante a época de reprodução”, indica a equipa.

Marcação de uma cria de abutre-preto na serra da Malcata. Foto: Dora Oliveira/ICNF

Já na Serra da Malcata, onde foi encontrada uma colónia de abutres-pretos em 2021, o número de casais aumentou este ano de 14 para 18, mas apesar de todos terem feito posturas, apenas sobreviveram 12 pequenos abutres até chegarem à independência. Esta colónia tem vindo a ser monitorizada num esforço conjunto entre os técnicos e vigilantes do ICNF – Direção Regional Centro e a Rewilding Portugal. “O parceiro local Associação Transumância e Natureza (ATN) tem feito a prospeção de ninhos noutras regiões relativamente próximas e potencialmente adequadas à espécie.”

Mais a norte, no Douro Internacional, fica a colónia mais isolada de todas, que este ano surpreendeu os técnicos do projeto com o aumento registado, de três para oito casais, incluindo três ninhos no lado espanhol da fronteira. “No entanto, todos estes novos casais poderão eventualmente ser muito jovens e inexperientes, pois dos oito casais, apenas cinco fizeram postura e só quatro crias (duas em cada país) sobreviveram até se tornarem independentes”, notam os responsáveis do LIFE Aegypius Monachus.

Cria de abutre-preto marcada com um amissor GPS/GSM, no Douro Internacional. Foto: Palombar

Para lidar com a fragilidade desta colónia, que é a mais distante de outras da espécie – fica a cerca de 100 quilómetros da mais próxima, situada em Espanha – o projeto começou a libertar abutres-pretos aclimatados. Os primeiros quatro foram devolvidos à natureza no início de novembro. A monitorização desta colónia – agora transfronteiriça – conta também com o apoio inter-regional entre a Palombar, a Direção Regional do Norte do ICNF e as equipas do Parque Natural Arribes del Duero.

Quanto à colónia da Vidigueira, descoberta há poucos meses, é a mais ocidental da espécie em todo o mundo. Apesar de não ser possível fazer-se uma monitorização muito próxima por se estar em plena época reprodutora,
o ICNF confirmou a presença de cinco ninhos e a reprodução bem-sucedida num deles. “A cria, um jovem macho, foi marcado com emissor GPS/GSM e batizado de Pousio”, indicam os responsáveis do projeto. 

Em Espanha, onde a equipa prevê a monitorização da espécie em duas zonas de proteão especial – Sierra de Gata y Valle de las Pilas e Canchos de Ramiro y Ladronera – foram contados este ano 153 casais nidificantes e 90 crias bem-sucedidas.

O projeto LIFE Aegypius Return é cofinanciado pelo programa LIFE da União Europeia. É coordenado pela VCF e tem como parceiros a Palombar – Conservação da Natureza e do Património Rural (com cofinanciamento da Viridia – Conservação em Ação), Herdade da Contenda, SPEA, LPN, ATN, Fundación Naturaleza y Hombre, Guarda Nacional Republicana e Associação Nacional de Proprietários Rurais Gestão Cinegética e Biodiversidade.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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