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Aves: saiba o que são as campanhas de anilhagem na migração outonal e para que servem

10.10.2024

De Agosto a Outubro, cerca de 100 ornitólogos portugueses e estrangeiros reúnem-se um pouco por todo o país para as campanhas de anilhagem das aves em migração outonal. Saiba o que são e para que servem.

Há 46 anos que o Centro de Estudos de Migrações e Proteção de Aves (CEMPA), situado em Alcochete e integrado no Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), coordena as campanhas de anilhagem na migração outonal das aves.

Estas campanhas decorrem entre Agosto e Outubro um pouco por todo o país e são organizadas por grupos de anilhadores e/ou anilhadores individuais. “Normalmente realizam-se em locais onde funcionam estações de anilhagem durante todo o ano”, explicaram à Wilder Nuno Ventinhas e Filipe Moniz, do CEMPA.

Anilhagem de um chamariz (Serinus serinus) na Cruzinha, Portimão. Foto: Júlio Reis/WikiCommons

O grande objectivo é conseguir informação regular e uniforme sobre as espécies migradoras que utilizam na sua rota migratória estes locais, de ano para ano. “Procura-se assim fazer também uma avaliação dos habitats que compõem os locais das estações, comparando depois com o número de aves e espécies que são capturadas e marcadas”, acrescentam.

Todos os anos participam nestas campanhas cerca de 100 pessoas, entre anilhadores e pessoas que estão em processo de formação para se tornarem anilhadores. Entre estes estão vários ornitólogos estrangeiros. “Os participantes estrangeiros costumam ser originários de Inglaterra devido ao número elevado de anilhadores que têm e porque procuram anilhar aves de espécies diferentes daquelas que ocorrem no seu país”, explicam os dois especialistas. “Pontualmente, participam pessoas de outros países com origem no resto da Europa.”

Não é fácil saber ao certo quantas aves sobrevoam Portugal durante as migrações de Outono. Mas há estimativas. “Estima-se que durante a migração outonal passem por Portugal alguns milhões de aves, sendo muito difícil estimar, uma vez que grande parte das aves migra inclusive durante a noite. É nesta altura que a maior parte das aves que se reproduzem na Europa migra para África, procurando climas mais quentes de modo a evitar os invernos rigorosos.”

São aves de muitas espécies diferentes, desde aves de rapina e cegonhas a limícolas e passeriformes, por exemplo.

Cegonha-branca. Foto: Matthias Barby/Wiki Commons

Segundo Nuno Ventinhas e Filipe Moniz, quem gosta de aves pode aproveitar para “observar algumas espécies que só ocorrem em Portugal nesta altura”. Além disso, também há aves que ocorrem em maior número nesta altura do ano. Por isso, as pessoas podem tomar partido das “significativas quantidades (de aves) que se concentram nos locais de paragem ao longo da rota de migração para se alimentarem”.

Um dos locais de eleição, a Estação Ornitológica Nacional

A Estação Ornitológica Nacional está situada no Monte do Outeirão, junto à Lagoa de Santo André, a maior lagoa do litoral alentejano, no concelho de Santiago do Cacém. É composta por um corpo de água salobra e por pequenas áreas com água doce, ambas envoltas em caniçais.

Ali fazem-se contagens de aves com recurso à anilhagem científica desde 1977, de forma contínua. Essa monitorização acontece ao longo de todo o ano, no âmbito de projetos tanto nacionais como internacionais.

Na campanha de Outono do ano passado, que durou 76 dias, “foram capturadas um total de 2853 aves” na Estação Ornitológica Nacional, contou à Wilder Paulo Encarnação, responsável pela Estação. Destas foram anilhadas 2409 aves de 70 espécies e subespécies; as restantes 444 de 35 espécies foram recapturadas.

Felosa-musical (Phylloscopus trochilus). Foto: Sharp Photography/WikiCommons

Segundo este ornitólogo, as espécies mais abundantes nesta altura do ano são o rouxinol-pequeno-dos caniços (Acrocephalus scirpaceus), a felosa-musical (Phylloscopus trochilus) e a andorinha-das-chaminés (Hirundo rustica). Mas já têm aparecido várias espécies mais raras. “Algumas das raridades mais marcantes foram a Embriza pusilla (escrevedeira-pequena) e a Acrocephalus paludícola (felosa aquática)”, destacou.

Este ano, a campanha na Estação Ornitológica Nacional começou a 25 de Julho e termina a 10 de Outubro, com o objectivo de monitorizar a migração outonal e formar novos anilhadores. Participaram 18 anilhadores portugueses e cinco ingleses.

E como é um dia de anilhagem durante as migrações outonais? Paulo Encarnação explicou que o dia começa pelas 06h00 “com a abertura das seis linhas de captura que, ao longo de cinco horas da sessão, são visitadas a cada 30 minutos”. Terminada a sessão, as redes são encerradas e enroladas para garantir a segurança das aves. “O esforço de captura é diário durante todo o período da campanha, sendo apenas interrompido por precipitação ou ventos fortes, o que coloca a segurança das aves em risco”, acrescentou.

Em cada Primavera e Outono, as aves empreendem longas e arriscadas viagens entre as suas áreas de reprodução e de invernada. 

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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