Magnus Robb corre o mundo para ouvir as aves

Embaixadores por Natureza
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Na nossa mini série que lhe apresenta os peritos que, nos bastidores, identificam as centenas de espécies que os nossos leitores nos enviam, perguntámos ao músico e ornitólogo Magnus Robb porque se interessa tanto pelo som das aves.

Magnus Robb, 52 anos, começou cedo a observar aves. Depressa este músico se interessou em gravar os seus sons. É um dos responsáveis pelo The Sound Approach, projecto que reúne mais de 75.000 registos de mais de 1.000 espécies de aves e é um dos maiores arquivos privados de sons de aves do mundo. A capacidade que as aves têm de se imitar umas às outras é algo que o fascina.

WILDER: Que idade tem, qual é a sua ocupação profissional e em que está a trabalhar neste momento?

Magnus Robb: Tenho 52 anos. A minha ocupação profissional é autoria e consultoria técnica sobre assuntos relacionados com os sons das aves. A maior parte do meu trabalho encaixa-se no projeto The Sound Approach, uma colaboração internacional para gravar e publicar os sons de aves para um público alargado. Neste momento estamos a fazer um guia de limícolas.

W: Porque é que se dedicou aos sons das aves?

Magnus Robb: Sempre gostei de observar aves. Comecei com os meus pais quando íamos de férias para o norte da Escócia, de onde sou natural. Também sou músico e é natural que os sons das aves tivessem chamado a minha atenção. Isto tornou-se mais intenso quando comecei a compor música e a ‘roubar’ material das aves. Escolhemos as limícolas para o guia atual principalmente porque o illustrador Killian Mullarney é grande especialista nelas e vive perto do melhor sítio para limícolas na Irlanda. Entretanto, ao longo dos últimos 20 anos aprendi muito com ele sobre as limícolas e dediquei-me muito a aprender os sons delas. Muitas espécies nidificam no Ártico, onde adoro fazer gravações. 

W: Como é que começou?

Magnus Robb: Comecei a gravar os sons das aves para estudar o conteúdo musical dos cantos. Gravava algum canto e atrasava a gravação para ouvir melhor as melodias. Rapidamente percebi que conseguia fixar e analisar melhor os sons das aves do que a maior parte dos observadores e decidi dedicar-me ao assunto, mesmo para os sons que não têm tanto valor musical.

W: O que o fascina mais nos sons feitos pelas aves selvagens?

Magnus Robb: Uma coisa que me fascina muito é a capacidade de imitação nos passeriformes. Nas espécies migradoras permite adivinhar onde passaram o inverno quando, por exemplo, estão inseridos sons de espécies africanas no canto. Já me aconteceu ouvir cinco espécies de abelharuco no canto de um rabiruivo-de-testa-branca no Ribatejo, dos quais só uma espécie era o ’nosso’ abelharuco e as outras eram espécies do Sahel, a sul do Sahara.

W: Quais são os principais desafios quando está a identificar espécies?

Magnus Robb: Os aspetos mais desafiantes da identificação das espécies através do som podem incluir 1) conseguir ouvir a espécie que interessa quando há muitas outras aves a voltar, por exemplo uma alvéola-amarela interessante no meio de um talhão de arroz no inverno, com centenas de alvéolas-brancas, limícolas, estorninhos e mais além; 2) conseguir ouvir pormenores em sons de duração muito curta, por exemplo uma escrevedeira onde a forma exata do chamamento (com duração de umas dezenas de millisegundos) é diagnóstica; 3) não ficar enganado pelas espécies que costumam imitar as outras. Por exemplo, ao ouvir um andorinhão ou papa-figos no inverno, pensar logo que deve ser um estorninho a imitá-lo e não um andorinhão ou papa-figos fora da época certa.

W: Como tem sido participar no “Que Espécie é Esta?” 

Magnus Robb: É sempre interessante saber quais os sons que captam a atenção dos leitores e quais as dificuldades em identificar. Gosto de tentar ajudar.

W: Tem alguma história curiosa relacionada com o seu trabalho de identificação de espécies que gostasse de partilhar?

Magnus Robb: Nas últimas semanas tive a grande sorte de estar no Quénia para gravar limícolas africanas para o guia em preparação. Uma vez descobri um casal de borrelho-de-três-golas (Cahradrius tricollaris) em paradas nupciais ao fim do dia, numa poça onde estavam dois hipopótamos. São animais perigosos, então tive que ter muito cuidado enquanto colocava um gravador para os borrelhos, sabendo que costumam estar muito ativos durante a noite. Estava com alguma preocupação sobre se os ‘hippos’ iriam pisar o gravador durante a noite. Quando voltei na manhã seguinte, felizmente, o gravador estava inteiro. Ali perto estava um casal de grou-coroado-oriental (Balearica regulorum), aves incrivelmente bonitas. Ao verificar rapidamente a gravação da noite soube que os borrelhos ficaram muito ativos, como tinha esperado, e tinha gravado quase o repertório completo deles, mas havia muito mais do que isso. Leões a menos de cem metros, por exemplo, hipopótamos muito faladores e muito mais. Vai ser um grande prazer identificar isto tudo nos próximos tempos!


Embaixadores por Natureza é uma mini série da Wilder dedicada à rede de especialistas que, desde 2017, são o coração do “Que Espécie É Esta?”. É o nosso reconhecimento e obrigado a tantas horas passadas a olhar com carinho, e de forma voluntária, para “os nossos” bichos e plantas. E a dar-lhes um nome. Sai todos os dias, de 1 a 16 de Agosto.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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