Uma equipa internacional, incluindo um investigador ligado ao centro de investigação cE3c, da Universidade de Lisboa, estudou o comportamento destes mega-herbívoros numa reserva em Moçambique. Ouça os sons que fazem estes animais.
Os resultados do estudo, que foram agora publicados na revista Current Biology, identificam diferenças nas respostas que os hipopótamos dão face às vocalizações de outros hipopótamos – consoante sejam do mesmo grupo, vizinhos ou estranhos.
A espécie Hippopotamus amphibius é um dos três mega-herbívoros de África, juntamente com o elefante e o rinoceronte, pois pesam todos mais do que uma tonelada. Apesar de o hipopótamo não ser considerado em risco de extinção, as suas populações decresceram dramaticamente nas últimas décadas. E a biologia da espécie – cujo conhecimento é importante para as estratégias de conservação – “é ainda misteriosa em muitos aspectos.”
“Estudar a biologia comportamental dos hipopótamos na natureza é complicado. É difícil, se não impossível, identificar e marcar indivíduos e por vezes altamente desafiante localizá-los”, explicam os quatro autores no artigo. Da equipa fazem parte Paulo Fonseca – professor na Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa e investigador do cE3c – Centro de Ecologia Evolução e Alterações Ambientais – e ainda outros investigadores ligados às universidades francesas de Saint-Etienne e de Lyon.
Os hipopótamos alimentam-se de noite, quase sempre de forma solitária, mas de dia permanecem em grupos dentro de água. Sabe-se que esses grupos são “socialmente estruturados em torno de um macho dominante, um número variável de fêmeas e os seus juvenis e alguns machos periféricos”. E acredita-se também que “o sistema social da espécie se baseia em sinais de comunicação”, uma vez que os hipopótamos “são muito vocais”.
Os sons que estes animais emitem incluem aliás um amplo repertório vocal, incluindo grunhidos e guinchos, e podem ser ouvidos até mais de um quilómetro de distância, indica uma nota de imprensa do cE3c. Mas está por saber, em grande medida, para que servem essas vocalizações.
Ouça um exemplo de sons de hipopótamos ouvidos na Reserva Especial de Maputo, gravado pelos investigadores:
Para compreender se são usadas para reconhecer amigos e estranhos, “os investigadores gravaram o som produzido por indivíduos de sete grupos diferentes de hipopótamos que vivem na Reserva Especial de Maputo, em Moçambique, e reproduziram-nos para cada grupo, a partir de um altifalante.”
A equipa decidiu focar-se numa vocalização conhecida em inglês como ‘wheeze honk’ – que significa algo como “arquejar buzina” – que é a mais utilizada por estes mamíferos quando comunicam entre si. Acredita-se que este chamamento é importante para a coesão social dos grupos, mas não se sabe bem qual será o seu papel exacto.
Ouça uma destas vocalizações ‘wheeze honk‘, recolhida pelos investigadores na Reserva Especial de Maputo:
Ao comparar as reacções dos hipopótamos perante os sons gravados, os cientistas perceberam que as respostas eram menos intensas quando ouviam vocalizações de outros animais do mesmo grupo ou de grupos vizinhos no mesmo lago.
Já ao ouvirem os sons de hipopótamos desconhecidos, emitiram “sons mais rápidos e mais frequentes” e “mostraram-se mais agressivos”. “Aproximaram-se do emissor de som e geralmente marcaram o seu território, defecando e lançando fezes em todas as direções, com o auxílio das caudas”.
Conclusão? Estes animais parecem conseguir diferenciar entre os sons daqueles que pertencem ao mesmo grupo, ou são vizinhos, e aqueles que são emitidos por grupos desconhecidos. A equipa acredita também que “os hipopótamos provavelmente conseguem distinguir diferentes indivíduos”, mas para já ainda não está comprovado.
Por outro lado, a chegada de um hipopótamo desconhecido parece ser mais ameaçadora do que a de um animal vizinho. Esse tipo de reconhecimento vocal existe também noutros grandes mamíferos, como por exemplo o elefante marinho.
Os resultados deste estudo podem agora passar a ser aplicados na gestão das populações de hipopótamos, que são muitas vezes deslocadas para outros locais devido à caça ou à perda de habita. Assim – sugerem os autores do artigo científico agora publicado – antes de um grupo de hipopótamos ser transferido para um novo território com outros hipopótamos, as vocalizações de ambos poderão ser gravadas e dadas a ouvir aos futuros vizinhos, através de altifalantes, de forma a diminuir a agressão quando se encontrarem.