Abutre-do-Egipto numa paisagem búlgara onde se aplica o Rewilding. Foto: Stefan Stefanov

Rewilding, juntos: Um caminho para restaurar o património natural de Portugal

20.03.2025

Neste dia 20 de março, celebramos o Dia Mundial do Rewilding e o tema deste ano, “Rewilding Juntos”, ressoa profundamente com a necessidade urgente de uma ação coletiva para restaurar os ecossistemas degradados da Europa.

A recente aprovação da Lei de Restauro da Natureza pelo Parlamento Europeu representa um marco histórico para a reversão do declínio da biodiversidade e para a adaptação às alterações climáticas. Agora, é crucial que Portugal traduza esta legislação em normas nacionais eficazes e significativas, capazes de catalisar a recuperação de habitats e espécies.  

A Lei de Restauro da Natureza estabelece metas ambiciosas, como o restauro de 20% dos ecossistemas terrestres e marinhos da União Europeia (UE) até 2030 e a recuperação de habitats essenciais, como florestas e rios. Para Portugal, esta legislação é uma oportunidade única para reverter décadas de degradação ambiental e falta de ambição política. A sua implementação exigirá uma abordagem estratégica, baseada na Ciência e na colaboração entre o Governo, organizações não-governamentais, comunidades locais e o setor privado.  

É aqui que o rewilding, ou renaturalização, se revela uma ferramenta poderosa. Ao permitir que a natureza se regenere por si própria, com intervenções humanas mínimas e estratégicas, o rewilding pode acelerar a recuperação de ecossistemas e trazer de volta espécies-chave que desempenham papéis vitais no equilíbrio ecológico.

Em Portugal, já estamos a ver os benefícios desta abordagem. Por exemplo, no Grande Vale do Côa, a reintrodução de herbívoros selvagens, como cavalos de raça Sorraia, está a ajudar a prevenir incêndios florestais e a promover a biodiversidade. Ao criar corredores ecológicos que permitem a movimentação de espécies e a coexistência com atividades humanas, a Rewilding Portugal está empenhada em demonstrar como o rewilding pode dar resposta a muitas das metas da Lei de Restauro da Natureza.

Para que esta e outras iniciativas tenham um impacto verdadeiramente transformador, é essencial que a transposição da Lei de Restauro da Natureza para o direito nacional seja feita de forma clara, ambiciosa e prática. O Despacho n.º 12734/2024, publicado no Diário da República, reconhece a importância de alinhar as políticas nacionais com os objetivos europeus. Este é um passo importante, mas precisamos de garantir que as medidas adotadas sejam suficientemente robustas para enfrentar os desafios específicos de Portugal, como a desertificação, os incêndios florestais e a perda de habitats críticos.  

É fundamental que as autoridades nacionais abracem medidas de restauro ambiciosas, como a reintrodução de espécies selvagens nativas mas localmente extintas, e deixem de bloquear os esforços de conservação e restauro liderados por organizações não-governamentais (ONG). A reintrodução e translocação de espécies-chave – como a cabra-montesa, o castor ou até o urso-pardo – são essenciais para o restauro de ecossistemas funcionais em Portugal. 

Infelizmente, os processos burocráticos excessivos e a falta de apoio institucional dificultam, ou até impedem, iniciativas que poderiam ajudar a atingir os objetivos da nova lei. É urgente que o Governo português adote uma postura mais colaborativa, simplificando procedimentos e apoiando ativamente os projetos de ONG que estão na linha da frente do restauro ecológico. 

A designação de 10% do território como áreas de proteção estrita é outro dos objetivos cruciais da nova lei. A Rewilding Portugal está a contribuir ativamente para esta meta, através da criação e gestão de áreas rewilding, onde a natureza pode regenerar-se com intervenção humana mínima. Estas áreas não só servem como refúgios para espécies ameaçadas, mas também como laboratórios vivos que demonstram os benefícios do rewilding para o restauro ecológico e a resiliência climática.

Para alcançar a meta dos 10%, é essencial que o Governo português reconheça e apoie iniciativas como estas, integrando-as numa estratégia nacional coerente e ambiciosa. Além disso, o Estado deve assumir um papel mais ativo na aquisição de terrenos para conservação, criando áreas protegidas pertencentes ao estado, que complementem os esforços das ONG. A proteção estrita de áreas-chave é um investimento no futuro do nosso país, garantindo que as gerações futuras possam usufruir de um património natural rico e vibrante.

Neste Dia Mundial do Rewilding, apelo a todos os portugueses para que se juntem a este movimento. O restauro da natureza não é apenas uma responsabilidade do Governo ou das organizações ambientais – é um esforço coletivo que exige o envolvimento de todos. Juntos, podemos garantir que a Lei de Restauro da Natureza seja implementada de forma eficaz e que as nossas paisagens e espécies possam florescer novamente.  

O rewilding não é apenas uma solução para a crise ecológica – é uma visão de um futuro onde os seres humanos e a natureza coexistem em harmonia. Vamos trabalhar juntos para tornar essa visão uma realidade.

 por Pedro Prata, líder de equipa da Rewilding Portugal

Don't Miss