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Lobo-ibérico. Foto: Arturo de Frias Marques/Wiki Commons

Ângela Morgado: “Precisamos que o Governo português se comprometa com a Natureza”

12.01.2021

O que pode 2021 trazer para a Biodiversidade e para a Conservação da Natureza? Com o ano que começa, a Wilder lança cinco perguntas a especialistas e responsáveis portugueses que trabalham para conhecer ou proteger o mundo natural.

Ângela Morgado é a diretora executiva na ANP (Associação Natureza Portugal)|WWF.

WILDER: O que espera de 2021 para a Conservação da Natureza em Portugal e no mundo?

Ângela Morgado: Portugal (e a União Europeia e o mundo em geral) deve, em 2021, ser firme no objetivo de garantir que a recuperação económica será VERDE e tornará a economia e a sociedade mais resilientes e mais inclusivas. A pandemia mostrou como a saúde humana está intimamente ligada com a proteção da natureza e como a natureza pode ser o nosso escudo protetor. À medida que os seres humanos invadem a natureza e esgotam os recursos naturais e habitats vitais, a vida humana fica em risco.  

O tempo é, por isso, de ação para relançar um Portugal mais justo, baseado em princípios verdes e de sustentabilidade, que assegurem uma economia climaticamente neutra, que proteja e restaure a natureza, a saúde e o bem-estar das pessoas sem deixar ninguém para trás. Por isso, precisamos que o Governo português (e os Governos de todo o mundo) se comprometa com a natureza, restaurando-a, travando a sua degradação e fixando metas ambiciosas para a proteção da biodiversidade, em linha com o Pacto Ecológico Europeu, o Acordo de Paris, os objetivos de proteção da biodiversidade e os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs).

Será fundamental por isso que em 2021 os Planos Nacionais de Recuperação e Resiliência demonstrem uma verdadeira Transição Verde e coloquem a natureza e o bem-estar das pessoas no centro de todas as decisões. 

W: No seu entender, quais devem ser as prioridades para este ano em prol da natureza em Portugal? E mais concretamente, para a presidência portuguesa da União Europeia?

Ângela Morgado: A ANP|WWF vai lançar uma lista de 6 desejos para esta Presidência Portuguesa do Conselho Europeu.  Esta lista de seis desejos será alvo de uma campanha nas próximas semanas e pretende estimular o debate junto do público em geral em torno da importância da Presidência Portuguesa para definir questões-chave da nossa vida ambiental e social. Portugal deve proporcionar uma Presidência mais transparente e aberta à sociedade civil. Só assim será possível elevar os níveis de confiança dos europeus na eficácia das Instituições Europeias e dos portugueses nas instituições nacionais. 

Na nossa opinião, os grandes temas para esta Presidência que se retratam nos nossos 6 desejos são a Agricultura, a Natureza, a Água, os Oceanos, o Clima e um Futuro mais Justo.

W: Quais as espécies ameaçadas que, na sua opinião, precisam de ajuda premente em 2021? 

Ângela Morgado: Temos trabalhado em Portugal na proteção de 2 espécies prioritárias em terra – o lobo ibérico e o lice ibérico – e vamos continuar a trabalhar em 2021 sobre estas espécies e os seus habitats, envolvendo as partes interessadas e visando a sua proteção. A nível marinho elegemos o cavalo marinho do Atlântico como espécie emblemática a proteger e vamos continuar a trabalhar para que tal aconteça. A nível marinho lançaremos ainda em 2021 mais um apelo à proteção de uma espécie emblemática dos nossos oceanos e que faz parte do imaginário de todos nós, que revelaremos em Fevereiro deste ano com a publicação de um relatório inédito sobre o tema e de uma campanha de comunicação correspondente.

W: Se coubesse a si decidir, qual seria a principal medida que tomaria este ano para tentar travar a extinção das espécies?

Ângela Morgado: Travar a perda de habitat. As espécies só sobrevivem com habitats saudáveis; reduzir para zero a diminuição de habitats significa travar a extinção de espécies. Estas são duas das metas do Novo Acordo para a Natureza e Pessoas que a rede WWF tem vindo a defender desde 2019 . Para a ANP|WWF só um novo Acordo, um novo caminho, nos vai permitir coexistir de forma sustentável com a natureza da qual dependemos.

W: Qual, ou quais, os projectos na área da Biodiversidade em que estará a trabalhar em 2021 que mais a entusiasmam?

Ângela Morgado: Felizmente estamos envolvidos em vários projetos muito inspiradores e que contribuem para este Novo Acordo, ou seja, contribuem para se atingir uma Natureza Positiva.

Ao nível do nosso programa Oceano e Pescas, destaco o projeto Partcipesca, sobre a cogestão da pescaria do polvo no Algarve que envolve várias associações de pescadores e muitas outras partes interessadas a trabalharem para um objetivo comum que é o de garantir a sustentabilidade desta pescaria ao nível social, ambiental e económico. Destaco ainda a colaboração programática com a Fundação Oceano Azul que nos permite trabalhar na conservação de habitats e de espécies emblemáticas marinhas, na sustentabilidade das pescas e na efetiva gestão das áreas marinhas protegidas. E ainda o projeto Porto Santo Sem Lixo Marinho, um projeto para reduzir a poluição por plástico nesta ilha e sensibilizar residentes e turistas para este problema e para as soluções que defendemos.

No programa Água destaco o projeto Reconnecting Iberian Rivers – que nos permitirá trabalhar em duas bacias muito importantes para Portugal em coordenação com Espanha – Douro e Tejo – visando uma gestão hídrica mais sustentável destas bacias.

Ao nível terrestre e florestal destaco os projetos de conservação do Lobo Ibérico que visa garantir a proteção desta espécie e o projeto Green Heart of Cork sobre pagamento de serviços ambientais no montado, um ecossistema muito importante do ponto de vista ambiental, social e económico, a produtores florestais que apresentam boas práticas e também o projeto Plantar Água que tem o apoio da fundação Coca-Cola e que vai permitir restaurar a paisagem florestal da serra do Caldeirão fustigada por incêndios de grande dimensão com benefícios ao nível da floresta e do ciclo hídrico. Este é um projeto de referência para nós pelo envolvimento de vários parceiros e que permite restaurar a paisagem e ao mesmo tempo promover um dialogo florestal nesta região.

Por último, o projeto Eat4Change que nos permitirá trabalhar o tema da alimentação e da dieta sustentável para alterar comportamentos alimentares prejudiciais para a natureza, apelando ao envolvimento de todos os portuguesas no compromisso com uma dieta mais amiga do ambiente. Este é um tema difícil mas muito importante e para o qual a nossa equipa está muito motivada.

Uma última nota para um projeto que visa a formação de líderes ambientais jovens que nos é muito caro pelo impacto que pode ter pois são os jovens que terão todas as palavras e ações a dizer e a realizar num futuro próximo e que se chama Generation Earth.

Recorde aqui as respostas de Helena Freitas, professora catedrática de ecologia no Departamento de Ciências da Vida da Universidade de Coimbra e é coordenadora do Centro de Ecologia Funcional.


Já que está aqui…

Apoie o projecto de jornalismo de natureza da Wilder com o calendário para 2021 dedicado às aves selvagens dos nossos jardins.

Com a ajuda das ilustrações de Marco Nunes Correia, poderá identificar as aves mais comuns nos jardins portugueses. O calendário Wilder de 2021 tem assinalados os dias mais importantes para a natureza e biodiversidade, em Portugal e no mundo. É impresso na vila da Benedita, no centro do país, em papel reciclado.

Marco Nunes Correia é ilustrador científico, especializado no desenho de aves. Tem em mãos dois guias de aves selvagens e é professor de desenho e ilustração.

O calendário pode ser encomendado aqui.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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