A organização WWF pede a seis países do Mediterrâneo, incluindo Portugal, que formem uma frente comum para prevenir incêndios.
O problema dos incêndios e a destruição que arrasta consigo não são novidade.
Mas o previsto agravamento da situação devido às alterações climáticas levou a que seis países – Portugal, Espanha, França, Itália, Grécia e Turquia – criassem agora o primeiro relatório mediterrânico sobre incêndios.
O documento “O Mediterrâneo arde“, lançado ontem em Portugal pela ANP|WWF, foi preparado em conjunto com os escritórios da WWF Espanha, França, Itália, Grécia e Turquia.
Uma das conclusões deste relatório é que mais de 80% da área total queimada por ano no continente europeu pertence a estes seis países. Por ano são, em média, 375.000 hectares queimados.
Nestas contas, Portugal é o campeão.
Ao longo da última década, Portugal teve quase o dobro do número de incêndios que outros países do Mediterrâneo.
Por ano, ardem em média no nosso país quase 140.000 hectares, em mais de 22.000 incêndios florestais.
“35% dos incidentes na Europa e 39% da área ardida em cada ano ocorrem em Portugal, resultando numa média de 3% de florestas portuguesas a serem devastadas todos os anos”, escreve a ANP – WWF em comunicado.
Os super incêndios
O relatório alerta para uma “tendência perigosa” que está a ganhar peso: os grandes incêndios florestais que queimam áreas superiores a 100 hectares. “Na última década, este tipo de incêndios foi responsável por 68% do total de área ardida, apesar de apenas representarem 0,66% do número total de incidentes.”
Além disso, há uma nova geração de incêndios no Mediterrâneo: os super incêndios, ou seja, “incêndios muito rápidos, letais e impossíveis de extinguir apesar dos avançados dispositivos de extinção”.
“É urgente assumir que temos um problema para o qual não estamos preparados”, diz Lourdes Hernández, especialista em incêndios florestais da WWF Espanha e principal autora do relatório.
“A paisagem, as montanhas, os actuais sistemas de combate a incêndios e a sociedade como um todo não estão preparados para essas tempestades de fogo geradas pelas alterações climáticas”, acrescenta.
Essas tempestades de fogo causaram situações dramáticas como as vividas em Portugal e Espanha em 2017 ou na Grécia em 2018, deixando 225 fatalidades no total.
Os incêndios estão a deixar de ser um problema florestal ou rural para se tornarem “emergências civis”.
Aposta na prevenção, em vez da extinção, do fogo
“É essencial mudar o nosso foco da luta contra o fogo e apostar na prevenção em vez da extinção”, defende Lourdes Hernández.
Isto porque, mesmo que o Acordo de Paris sobre o Clima seja observado e o aumento de temperatura permanecer inferior a 1,5ºC, “as áreas ardidas do Mediterrâneo serão 40% maiores do que hoje”, concluiu o relatório.
O estudo científico que originou esta percentagem, conduzido por investigadores da Universidade de Barcelona e publicado no final de 2018, diz ainda que esse número duplicaria no pior cenário climático, que prevê um aumento de temperatura de 3ºC.
Para a WWF, a única estratégia eficaz é “reduzir a alta taxa de incidentes e tornar o território menos inflamável e mais resiliente às alterações climáticas”.
Por isso, a organização pede a criação de uma Estratégia Comum para a Prevenção de Incêndios naqueles seis países. Essa estratégia deverá listar medidas de prevenção a longo prazo e um sistema de acompanhamento e monitorização da implementação de políticas e fundos comunitários destinados à prevenção de incêndios em Estados membros.
Em concreto para Portugal, a ANP – WWF pede um “aumento nos esforços de pesquisa sobre as causas e motivações dos incêndios, a par com maior severidade nas penas e o fim da impunidade”.
No nosso país, em média, 54% dos fogos têm origem desconhecida. Para Rui Barreira, director de Conservação da ANP – WWF, esta “é uma das principais mudanças que é necessário efectuar. Como se podem prevenir fogos sem saber como estes começam?”
A ANP – WWF defende ainda a promoção de um bom planeamento e gestão florestal – “dando prioridade às áreas de maior risco de incêndios florestais, diversificando usos e exploração” – e o combate às alterações climáticas, “o que acelera e intensifica este grave problema”.