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Mexilhão de água doce

Mexilhões de água doce portugueses estão em perigo crítico

08.09.2023

Um estudo recentemente publicado na revista Biological Conservation revela o perigo crítico em que se encontram os mexilhões de água-doce em Portugal, um grupo animal altamente ameaçado globalmente.

Os mexilhões de água-doce são um grupo de bivalves com mais de 900 espécies que podem ser encontradas em rios e lagos de todos os continentes, onde eram, historicamente, extremamente abundantes. Estes animais desempenham um papel importante nos ecossistemas, melhorando a qualidade da água e do substrato e fornecendo habitat fundamental para outras espécies.

Em Portugal não existiam até agora dados sobre as tendências populacionais destes animais.

Mexilhões das espécies Unio delphinus e Unio tumidiformis, endémicas da Península Ibérica. Foto: André Santos 

Através de um levantamento das populações de mexilhões de água doce em 132 locais, abrangendo 15 bacias hidrográficas distintas, uma equipa de investigadores verificou que os dados são “dramáticos e extremamente preocupantes”, segundo um comunicado do BIOPOLIS-CIBIO – Centro de Investigação em Biodiversidade e Recursos Genéticos da Universidade do Porto.

O estudo revela um declínio generalizado de 60% no número de locais e uma redução impressionante de 67% na abundância total de mexilhões de água doce em Portugal ao longo das últimas duas décadas. Estes resultados estão em linha com os observados no decorrer do projeto EdgeOmics, financiado pela Fundação para a Ciência e a Tecnologia, cujo objetivo é avaliar e prever o impacto resultante das alterações climáticas nestes mexilhões. 

Mexilhões de rio da espécie Unio delphinus no seu habitat natural. Foto: André Santos

Segundo o Manuel Lopes Lima, investigador do CIBIO e da Estação Biológica de Mértola, todas as espécies de mexilhões de água-doce estão em declínio rápido e em risco de extinção em Portugal, sendo que esta informação foi já incluída na produção do recente Livro Vermelho dos Invertebrados de Portugal, onde todas as espécies se encontram como ameaçadas e protegidas.

Os mexilhões de água-doce tem geralmente uma vida longa e são altamente sensíveis a perturbações do habitat, tornando-os bons indicadores da integridade ecológica dos ecossistemas de água doce. 

O estudo aponta como principais causas dos declínios o aumento de secas prolongadas, a alteração de habitat ribeirinho por barragens e a introdução de espécies exóticas, tais como a amêijoa asiática.

Seca agravada na Ribeira de Oeiras da bacia do Rio Guadiana. Foto: Manuel Lopes Lima

Este trabalho indica ainda que as espécies de mexilhões de água-doce protegidas na União Europeia são inadequadamente monitorizadas. “Mesmo as espécies classificadas como comuns deveriam receber mais atenção, pois poderão estar impropriamente avaliadas, tal como se mostrou no presente estudo. Esta questão é particularmente alarmante na região do Mediterrâneo, onde o endemismo das espécies é elevado e os habitats de água-doce severamente afetados pela escassez de água”, defendem os autores.

Segundo Elsa Froufe, do Centro Interdisciplinar de Investigação Marinha e Ambiental (CIIMAR) da Universidade do Porto, para reverter as alarmantes tendências populacionais em declínio, há a necessidade urgente de uma gestão mais eficiente da água, da implementação de restrições de irrigação em áreas de biodiversidade vitais, da mitigação de alterações hidrológicas e da restauração da conectividade perdida dos habitats aquáticos devido a anteriores alterações físicas, tais como barragens e açudes.

Por outro lado, para prevenir a extinção das espécies mais criticamente ameaçadas – como a Margaritifera margaritifera, Potomida littoralis e Unio tumidiformis, cujas populações caíram para níveis quase residuais – é imperativo agir com ações de conservação urgentes como o estabelecimento de programas de reprodução em cativeiro, proteção estrita das populações restantes e restauração de habitats em larga escala.

Seca agravada no Rio Vascão da bacia do Rio Guadiana. Foto: Joaquim Reis

Este estudo foi realizado por investigadores de seis instituições académicas portuguesas: U. Porto, I.P. Bragança, U. Minho, U. Trás-os-Montes e Alto Douro, U. Lisboa e U. Évora.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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