Uma nova análise sugere que 3.585 espécies de animais estão ameaçadas pelas alterações climáticas. “Estamos a entrar numa crise existencial para os animais selvagens da Terra”, diz William Ripple.
“Até agora, a principal causa da perda de biodiversidade tem sido a ameaça dupla da sobre-exploração e das alterações dos habitats, mas à medida que as alterações climáticas se intensificam, prevemos que estas se tornem na terceira maior ameaça aos animais da Terra”, acrescentou Ripple, professor de Ecologia na Universidade norte-americana do Estado do Oregon e coordenador deste estudo publicado a 20 de Maio na revista BioScience.
Ripple e outros investigadores dos Estados Unidos e México usaram bases de dados sobre biodiversidade para analisar as 70.814 espécies de animais que estão avaliadas pela Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). Mas estas representam apenas 5.5% das espécies de animais descritas até agora para a Ciência (1,281,520 espécies, das quais 962,178 são insectos) e uma percentagem ainda menor dos milhões de espécies do planeta (incluindo aquelas que ainda estão por descrever).
Segundo os autores do estudo, um total de 3585 espécies de animais da Lista Vermelha estão ameaçadas pelas alterações climáticas. Destas, 1774 são terrestres, 712 são espécies de água doce e 441 são marinhas.
Mais concretamente, 1735 estão ameaçadas pelas secas, 1646 pela alteração dos seus habitats, 924 por tempestades ou inundações e 792 por temperaturas extremas.
“Esperamos que algumas destas ameaças se tornem muito mais graves nos próximos anos porque mesmo ligeiros aumentos nas temperaturas médias podem levar a aumentos dramáticos dos fenómenos climatéricos extremos”, alertam os investigadores.
“Estamos particularmente preocupados com os animais invertebrados no oceano, que absorve a maioria do calor das alterações climáticas”, disse Ripple em comunicado. “Aqueles animais estão cada vez mais vulneráveis por causa da sua limitada capacidade para se movimentar e escapar depressa o suficiente de condições adversas.”
O colapso de populações de animais por causa das alterações climáticas já começou em vários locais do planeta. Nem todos estão documentados. As comunidades de animais podem sofrer episódios de mortalidade em massa por causa de eventos como ondas de calor, incêndios, secas e inundações.
Nos oceanos, o colapso de invertebrados está a tornar-se comum. A redução de 90% das populações de moluscos ao longo da costa de Israel por causa do aumento das temperaturas mostra o quão susceptíveis são os invertebrados, considera Ripple.
Outros exemplos incluem a catastrófica morte de corais em cerca de 29% da Grande Barreira de Coral, depois de uma severa onda de calor em 2016. A mesma onda de calor causou um declínio de 71% no bacalhau do Pacífico por causa de um aumento das necessidades metabólicas e de uma redução das presas disponíveis. Os autores do estudo acreditam ainda que as ondas de calor terão tido um papel na morte de cerca de 7.000 baleias-de-bossa no Pacífico Norte.
O estudo lembra também que, por causa das ondas de calor marinhas, mais de 10 mil milhões de caranguejos-das-neves (Chionoecetes opilio) do Mar de Bering Sea terão desaparecido desde 2018 por falta de alimento.
“Os efeitos em cascata de mais e mais eventos de mortalidade em massa irão afectar os ciclos de carbono e de nutrientes”, comentou Ripple. “Esses efeitos irão também ter um impacto nas interacções entre espécies, desde a predação e competição à polinização e ao parasitismo, que são vitais para o funcionamento dos ecossistemas.”
Mas há mais casos citados por esta investigação. “Dados da América do Norte e da Europa indicam que o aumento do número de dias anormalmente quentes contribuiu para agravar as taxas de extinções locais de abelhões (Bombus spp.) e reduzir a diversidade de espécies.
Os investigadores estão preocupados com a pouca informação que tem sido recolhida sobre o risco das alterações climáticas para a vida selvagem. “A nossa análise pretende ser um esforço preliminar no sentido de avaliar o risco das alterações climáticas para as espécies selvagens”, comentou Ripple. “Compreender o risco é crucial para tomarmos decisões políticas informadas. Precisamos de uma base de dados global sobre os eventos de mortalidade em massa causados pelas alterações climáticas nas espécies de animais em todos os ecossistemas, e um acelerar da avaliação das espécies que ainda são ignoradas.”
A Lista Vermelha da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN) está enviesada para os vertebrados, que representam menos de 6% das espécies de animais conhecidas hoje na Terra. Por isso, salientam os investigadores, “é provável que muitas espécies em risco por causa das alterações climáticas e outras ameaças ainda não tenham sido sinalizadas”.
“Além disso, há também uma necessidade para avaliações de risco climático mais frequentes de todas as espécies e uma melhor consideração da capacidade de adaptação”, acrescentou. “Precisamos de uma integração do planeamento das políticas de biodiversidade e alterações climáticas a uma escala global.”