Equipa internacional analisou fóssil de leopardo encontrado por espeleólogos numa gruta da Serra de Santo António, concelho de Porto de Mós, e confirmou tratar-se de um leopardo semelhante aos que hoje habitam os Himalaias. Terão chegado à Península Ibérica durante a última Idade do Gelo.
O fóssil português, descoberto em 2000 e alcunhado de “leopardo do Algar da Manga Larga”, faz parte da coleção do Museu Geológico, onde estava até hoje sem indicação da espécie a que agora se confirmou pertencer. Inclui uma peça-chave para os investigadores: um crânio bem conservado, que permitiu à equipa fazer medições e compará-lo com outros quatro fósseis que foram também analisados, provenientes da China e de França.
Os resultados deste estudo foram publicados pela revista Science Advances, num artigo liderado por Qigao Jiangzuo, da Universidade de Beijing, e por Joan Madurell Malapeira, da Universitat Autònoma de Barcelona (UAB). Da equipa fazem também parte dois investigadores da NOVA School of Science and Technology, no Monte da Caparica, e do Museu da Lourinhã, Darío Estraviz-López e Octávio Mateus.
Atualmente restam apenas cerca de 4000 exemplares de leopardo-das-neves (Panthera uncia) no mundo, considerados em risco de extinção. Vivem apenas a grandes altitudes, acima dos 2000 metros, concentrados na região dos Himalaias.
No estudo agora publicado, a equipa procurou traçar a história de como evoluíram estes felinos de tamanho médio e de que forma se dispersaram pelo mundo. Compararam as características dos fósseis de leopardo-das-neves, incluindo o crânio de Porto de Mós, com os seus parentes mais comuns, os leopardos, concluindo que os primeiros estavam adaptados a caçar presas robustas, como a cabra-montês.
Outras características, como extremidades fortes e uma longa cauda que ajudavam estes animais a dar grandes saltos e a manter o equilíbrio desenvolveram-se rapidamente até há meio milhão de anos, coincidindo com as fass mais frias das últimas idades do gelo. Foi precisamente nesta época que estes felinos se terão dispersado dos Himalaias até ao centro da China, chegando ao oeste da Península Ibérica.
Motivos de esperança
“Propomos que há cerca de 900.000 anos a intensificação gradual das glaciações na Eurásia traduziu-se na aparição progressiva de espaços mais abertos, e isso terá possibilitado a chegada da espécie a Portugal, onde viveu até há relativamente pouco tempo, uns 40.000 anos”, indicou Joan Madurell Malapeira, citado numa nota de imprensa da UAB.
A descoberta deste fóssil em Portugal, a baixas altitudes, levou a equipa a questionar se afinal as preferências de habitat deste leopardo estão mais relacionadas com terrenos rochosos e escarpados e com climas frios, do que dependentes de locais a grandes altitudes.
“A nossa análise leva-nos a concluir que seguramente a grande altitude e a neve não terão sido os fatores limitantes para a distribuição da espécie, mas sim a presença de espaços abertos e escarpados”, acrescentou o investigador. “O leopardo-das-neves sempre esteve adaptado para viver na montanha, mas não necessariamente a grandes alturas e com neve. E isso, num contexto de alterações climáticas como o atual, dá-nos esperança de podermos garantir a sua sobrevivência.”
No futuro, a equipa pretende explorar mais a fundo a neuroanatomia e a ecologia do leopardo do Algar da Manga Larga, o que poderá trazer mais pormenores à história deste predador.