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abelha pousada numa flor
Foto: Wilder/Arquivo

Novo livro: “A extinção dos polinizadores põe em risco a biodiversidade e a nossa saúde”

21.04.2025

Anna Traveset, investigadora do Conselho espanhol Superior de Investigações Científicas (CSIC), alerta para a crescente perda de espécies polinizadoras no seu novo livro “La Crisis de los Polinizadores”, publicado este mês.

Não são tão vistosos nem tão grandes como um tigre ou um elefante mas os animais polinizadores também estão em risco de extinção e são essenciais para a biodiversidade e para o nosso bem-estar.

Assim o escreveu a investigadora Anna Traveset no livro “La Crisis de los Polinizadores”, uma obra que tem como objectivo transmitir o conhecimento existente sobre estas espécies e sobre o seu estado de conservação, explicar as causas e consequências do seu declínio e, sobretudo, dar a conhecer a sua importância para o bom funcionamento dos ecossistemas do planeta.

O livro também analisa como esta crise é reconhecida e gerida pelos decisores políticos, profissionais do sector agrícola e pela sociedade. E sugere estratégias de sensibilização e conservação dos polinizadores. 

“Por surpreendente que pareça, o valor da polinização animal não só passa desapercebido pela sociedade em geral mas também por uma boa parte do sector agrícola”, comentou Anna Traveset, em comunicado. “Muitas das pessoas que trabalham na agricultura desconhecem a importância de conservar os insectos domesticados que precisam dos seus cultivos mas também as espécies silvestres”, acrescentou.

Segundo Anna Traveset, “a importância dos polinizadores remonta a mais de 150 milhões de anos e tem tido um grande impacto sobre a evolução das plantas e sobre o funcionamento do planeta”.

Estima-se que 90% das plantas que produzem flores são polinizadas por animais; dependem deles, total ou parcialmente, para produzir sementes e, por isso, para manter o seu ciclo biológico. Além de serem fundamentais para manter a biodiversidade nos ecossistemas, os polinizadores funcionam como “pontes ecológicas” porque as plantas que polinizam servem de alimento a outras espécies.

Se olharmos para o ponto de vista económico, os números não deixam lugar para dúvidas. A investigadora do Instituto Mediterráneo de Estudios Avanzados (IMEDEA) afirma que, à escala mundial, estima-se que 75% das 115 culturas mais importantes para a alimentação humana dependem, em maior ou menor grau, da polinização animal. O cacau, o café, as amêndoas, os pêssegos ou as cerejas dependem entre 40 e 100% dos polinizadores.

Além disso, acrescentou, uma maior diversidade de polinizadores não apenas aumenta a produção de frutos como melhora a sua qualidade nutricional, o tamanho ou o peso. “Foi demonstrado que nas explorações agrícolas que garantem uma maior abundância e riqueza dos polinizadores, a produção é maior em comparação com as que apenas recorrem a polinizadores domesticados”, explicou.

Muito mais que abelhas

As plantas recorrem a três grandes mecanismos para transportar o pólen e assegurar a sua reprodução: o vento, a água e os animais. Os principais “mensageiros do pólen” são os insectos e o grupo por excelência é o das abelhas. Mas este trabalho valioso também é feito por animais vertebrados, entre eles aves, mamíferos e répteis.

Segundo a autora, hoje existem, pelo menos, 193 famílias de insectos polinizadores. Entre elas, o grupo mais diverso é o dos lepidópteros, ao qual pertencem as borboletas diurnas e as noturnas. “Vários estudos revelaram que as borboletas podem ser tão eficazes como as abelhas na polinização de numerosas espécies de plantas.” Algumas dessas borboletas até são capazes de transportar o pólen entre flores a maiores distâncias, ajudando assim a reduzir a probabilidade de endogamia.

Os escaravelhos também desempenham um importante papel polinizador, sobretudo em habitats do Sul de África onde há poucas abelhas.

No grupo dos himenópteros, as abelhas são as polinizadoras por excelência, basicamente porque tanto as larvas como os adultos dependem das flores para se alimentarem. A investigadora sublinhou que só na Península Ibérica existem mais de 1100 espécies de abelhas, um número maior do que o de vertebrados, e continuam a aparecer novas espécies. “As espécies mais conhecidas entre as pessoas não especialistas são a abelha-do-mel e o abelhão, mas as abelhas solitárias representam mais de 90% de todas as abelhas.”

Dentro dos himenópteros, as vespas também são polinizadores importantes. Também as formigas visitam as flores e comprovou-se que polinizam de forma eficiente algumas espécies.

Entre os polinizadores vertebrados, os colibris – que só vivem no continente americano -, são os mais importantes. Se falarmos de mamíferos, os morcegos são o grupo que mais se destaca. “Algumas espécies mostram adaptações específicas para chegar ao néctar das flores, como ter uma língua maior do que o próprio corpo”, salientou Traveset. Sem serem tão abundantes, os répteis como as lagartixas também podem ser polinizadores.

As ameaças e o que podemos fazer

As alterações no uso dos solos, o aumento da aplicação de pesticidas, as espécies exóticas invasoras e as alterações climáticas são os factores que mais influenciam a biodiversidade em geral e a abundância e diversidade de polinizadores.

A perda de polinizadores é um fenómeno complexo mas a investigadora sugere várias medidas de conservação que podem ajudar a reverter a situação.

Melhorar a heterogeneidade do habitat com diversidade de plantas e ecossistemas – incluindo árvores e matagais mediterrânicos nas plantações – e favorecer os habitats de nidificação de polinizadores, deixando zonas de solo sem lavrar ou sem mobilização de solo, fazem parte das práticas agro-ecológicas propostas.

 Outra medida baseia-se em criar faixas florais, ou seja, deve-se deixar uma superfície de solo na margem das culturas, ou entre elas, para que cresçam plantas onde os polinizadores se possam refugiar.

A investigadora afirmou que, com 41% das espécies conhecidas em perigo de extinção, o declínio dos insectos a nível mundial pode considerar-se “grave”.

O problema, acrescentou, é que faltam estimativas a grande escala de como as alterações mundiais estão a afectar a sua distribuição. “A informação actual provém, principalmente, de estudos de campo a curto prazo com menos de cinco anos e em poucas localizações”, constatou. “A maioria do conhecimento actual sobre os polinizadores baseia-se em alterações na riqueza de espécies e distribuição, mas é preciso, urgentemente, uma monitorização sistemática, a longo prazo, para estabelecer uma linha base do seu estado, identificar as causas do declínio e orientar medidas de resposta”, acrescentou a autora.

Apesar de a agricultura ser uma das causas da crise dos polinizadores, por causa de práticas intensivas e mudanças no uso dos solos, também poderia fazer parte da solução.

A investigadora do CSIC explicou que, a nível internacional, foram propostas duas medidas complementares para o conseguir: promover uma agricultura mais ecológica que integre a polinização e o controlo natural de pragas e apoiar sistemas agrícolas mais diversos.

Em Portugal, por exemplo, o projecto PolinizAÇÃO – coordenado por Sílvia Castro e João Loureiro, docentes e investigadores no Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra – visa combater o declínio de abelhas, borboletas, moscas-das-flores e outros insectos vitais para a sobrevivência de inúmeras plantas e culturas em território nacional.


LA CRISIS DE LOS POLINIZADORES

Por: Anna Traveset

Editora: CSIC e Catarata

Data de publicação: Abril de 2025

Número de páginas: 144

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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