Chromis abadhah. Foto: Luiz Rocha

Academia das Ciências da Califórnia descreveu 138 novas espécies em 2024 e explica por que isso é importante

20.12.2024

Cientistas da Academia das Ciências da Califórnia descreveram ao longo deste ano 138 novas espécies, desde peixes, plantas e aranhas a fungos e lagartos, revelou a instituição em comunicado.

Investigadores da Academia das Ciências da Califórnia descreveram um total de 138 novas espécies de animais, plantas e fungos em 2024, ajudando “a enriquecer o que sabemos sobre a biodiversidade da Terra e a reforçar a nossa capacidade para regenerar o mundo natural”, escreveram em comunicado enviado ontem à Wilder.

As novas espécies incluem 35 peixes, 17 bichos-folha, 15 cigarrinhas, 14 minhocas, 12 lagartos, 11 fósseis de gastrópodes, nove plantas, oito poliquetas-marinhas, sete aranhas, sete escaravelhos, dois tubarões, uma enguia, um gecko, um grilo e um cavalo-pigmeu. Mais de 10 cientistas, juntamente com vários colaboradores internacionais, descreveram estas espécies novas para a Ciência.

“Descobrir e descrever novas espécies é vital para compreendermos a biodiversidade do nosso planeta e protegê-la de mais perdas”, comentou Shannon Bennett, investigadora da Academia. “Os cientistas estimam que identificámos apenas um décimo de todas as espécies na Terra. Apesar de ser crucial protegermos as espécies ameaçadas conhecidas, precisamos também de direcionar recursos para a identificação de espécies desconhecidas que possam ser tão importantes como as outras para o funcionamento de um ecossistema”, acrescentou.

“Essas espécies ainda por descrever, alicerces vivos, dão um entendimento mais vasto sobre como os ecossistemas evoluíram e como funcionam, incluindo as melhores maneiras de os proteger e regenerar. No final de contas, não podemos proteger ou importarmo-nos com o que não sabemos que existe.”

O nosso planeta ainda alberga locais inexplorados e plantas e animais ainda não registados. Estes cientistas fizeram as suas descobertas nos seis continentes e em três oceanos, desde os picos de montanhas às profundidades do mar.

Aqui ficam cinco das 138 espécies que ficámos a saber que existem:

Um peixe das profundidades, Chromis abadhah:

Chromis abadhah. Foto: Luiz Rocha

O curador da colecção de Ictiologia da Academia, Luiz Rocha, descreveu uma nova espécie de peixe, Chromis abadhah, que vive nas Maldivas.

Este peixe dos recifes foi descoberto durante um censo naquela região. Rocha e os seus colaboradores escolheram o nome abadhah, a palavra local Dhivehi para “perpétuo”. “Este género era anteriormente conhecido apenas dos recifes mais à superfície nas Maldivas, por isso foi uma surpresa quando a equipa de mergulho descobriu o C. abadhah em profundidades dos 30 aos 150 metros”, explicou o biólogo e co-autor do artigo, Ahmed Najeeb. “Este complemento ao inventário de espécies que vivem nas águas das Maldivas é um passo encorajado para continuar a explorar a nova vida marinha.”

Rocha espera que esta espécie possa chamar a atenção para a necessidade de protegermos os recifes de profundidade. “Esta bonita e elegante espécie foi descoberta em recifes que ainda nunca tínhamos visto; ainda assim encontrámos sinais do impacto humano em cada um dos mergulhos, desde poluição por plásticos e redes de pesca abandonadas ao branqueamento de corais.”

Uma nova espécie de cavalo-pigmeu, Cylix nkosi:

Cylix nkosi. Foto: Richard Smith

Depois de descrever o género de cavalos-pigmeus Cylix em 2021, o investigador Graham Short acrescentou outra espécie ao grupo, a C. nkosi. O género foi originalmente encontrado nas águas em redor da Nova Zelândia. Mas esta nova espécie foi encontrada nas águas subtropicais ao largo da África do Sul, aumentando oficialmente a distribuição conhecida deste grupo no Oceano Índico.

“Ouvimos mergulhadores locais da Baia Sodwana, na África do Sul, falar de uma espécie desconhecida. Por isso suspeitámos que tínhamos encontrado algo novo”, comentou o co-autor Richard Smith. “São difíceis as condições de mergulho nos recifes da África do Sul, com mau tempo e ondas fortes; sabíamos que tínhamos apenas um mergulho para encontrar aquela espécie. Além disso, ela é muito pequena e consegue camuflar-se, passando desapercebida. Felizmente conseguimos encontrar uma fêmea camuflada junto a algumas esponjas numa zona de fundos arenosos não muito longe da costa”, acrescentou.

Graham Short salientou o valor das colecções dos museus para fazer estas descobertas. “Para descrever uma nova espécie precisamos de, pelo menos, um espécime macho e outro fêmea para estudar qualquer dimorfismo sexual e para o rigor científico. Estudámos um único espécime macho, aos cuidados do Instituto Sul Africano para a Biodiversidade Aquática, e que estava por identificar desde que foi colhido em 1987, para completar o estudo.”

Uma dália comestível e ameaçada, a Dahlia gypsicola: o investigador Isaac Lichter-Marck estuda plantas que “vivem em sítios estranhos”. Este ano, Lichter-Marck co-descreveu a Dahlia gypsicola, uma nova espécie de dália que sobrevive nos solos pobres de Oaxaca, no México.

Ao contrário das dálias ornamentais que pode encontrar no seu jardim, esta flor criticamente ameaçada tem uma série de adaptações evolutivas, como folhas semi-suculentas e uma raíz grossa para armazenar água, que a ajuda a sobreviver nas encostas das montanhas Sierra Madre del Sur.

“Esta descoberta (…) chama a atenção para Oaxaca como um centro de biodiversidade e para as áreas do México que devemos continuar a estudar”, comentou o co-autor e investigador Arturo Castro-Castro. “Também é um contributo para o rico património biocultural do México, uma vez que as raízes e as flores de muitas espécies de dália são comestíveis. As folhas da D. gypsicola, semi-suculentas e aromáticas, são consumidas cruas pelos habitantes de San Sebastián Tecomaxtlahuaca e de Santiago Juxtlahuaca na região Mixteca de Oaxaca.”

Oito espécies de poliquetas-marinhas: numa revisão do género Iphione de poliquetas-marinhas, a responsável pela colecção de invertebrados na Academia, Christina Piotrowski foi a co-autora de um artigo que descreve oito espécies diferentes mas que, até agora, estavam taxonomicamente juntas. Ao analisar sequências de ADN e comparando espécimes guardados em museus recolhidos em vários locais do mundo, Piotrowski e os seus colaboradores foram capazes de definir fronteiras mais rigorosas dentro do grupo Iphione. “Os museus funcionam como uma biblioteca da biodiversidade do planeta, permitindo aos cientistas fazer novas descobertas e testar novas teorias sobre a definição de espécies”, comentou.

Estes pequenos animais vivem em quase todos os habitats do oceano e têm funções cruciais nas cadeias alimentares marinhas, desde reciclar nutrientes a manter a biodiversidade. Este grupo é incrivelmente diverso, com quase 13.000 espécies conhecidas. Ainda assim, continua muito pouco estudado.

Para Piotrowski, estudar estes invertebrados representa uma abordagem mais holística à conservação e à ciência da biodiversidade. “Quando se avalia a saúde e resiliência ambiental tendem a ter prioridade as espécies carismáticas e bem conhecidas, como os animais vertebrados. Mas isso não leva em conta a biodiversidade total de um ecossistema e, por isso, só nos pode dar uma imagem parcial das necessidades de conservação de um habitat. Precisamos de compreender melhor um sistema natural para o protegermos melhor”, explicou.

… E 17 espécies de insectos: Os investigadores da Academia Brad Balukjian e Matt Van Dam introduziram 17 novas espécies de insectos à família Pseudoloxops, da Polinésia Francesa. Conhecidos como “bichos-folha”, estes invertebrados são pequenos e de cores vivas e que podem ser encontrados nas flores ou nas folhas jovens de plantas nativas. Alunos da escola da ilha de Mo’orea deram o nome a grande parte destas novas espécies.


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Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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