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Coruja-das-torres. Foto: Istock

Corujas-das-torres tornam-se “invisíveis” à luz da Lua

18.12.2024

A chamativa cor branca da coruja-das-torres (Tyto alba) poderá ser uma adaptação que as torna mais difíceis de ver para as suas presas quando voam contra o céu nocturno, revela um novo artigo científico.

Os animais precisam de se confundir com o seu ambiente para evitar serem detectados, tanto se são presas como se são predadores. A camuflagem é considerada um fenómeno diurno, baseado principalmente na luz e na sombra. Mas pode um animal camuflar-se durante a noite, indo mais além da da cobertura que lhe dá a escuridão?

Um novo estudo publicado a 16 de Dezembro na revista PNAS, liderado pela Estação Biológica de Doñana/CSIC, quis responder a esta pergunta. Para isso investigou a coloração da coruja-das-torres.

A coruja-das-torres é uma coruja de cor branca e diferente das outras rapinas nocturnas, que têm plumagens com padrões complexos que, claramente, os ocultam no seu ambiente. O voo da coruja-das-torres é tão silencioso como o de qualquer outra coruja mas a sua plumagem ventral branca poderia alertar as suas presas. Mas, segundo este novo estudo, isto não é necessariamente assim.

“Trabalhámos com a hipótese de que a plumagem da coruja-das-torres pode representar um tipo de camuflagem nocturna inovador”, explicou, em comunicado, Juan J. Negro, especialista em ecologia do comportamento e investigador da Estação Biológica de Doñana/CSIC. “A ocultação da coruja-das-torres em voo de caça consegue-se quando o seu contraste contra o céu está abaixo do limiar da detecção de objectos por parte das suas presas, tipicamente roedores que procuram alimento no solo.”

A condição de quase total “invisibilidade” para o desprevenido ratinho que propõe a equipa de investigadores geralmente não acontece em noites completamente nubladas ou sem Lua. Mas, nas noites claras e com Lua, há uma compensação entre a luz da abóbada celeste detrás da coruja-das-torres e a luz reflectida por ela até ao solo onde está a presa. Deste modo, a coruja pode tornar-se quase indetectável para o ratinho que, quando finalmente vê a coruja, já é demasiado tarde e não tem escapatória.

Estes resultados estão de acordo com observações prévias de outros investigadores que indicam que, em noites de Lua cheia, as corujas mais brancas conseguem capturar mais presas do que as corujas mais escuras.

“Estudámos a eficiência da plumagem branca das corujas como meio para se camuflarem quando caçam, tendo em conta as propriedades radiométricas do céu, o solo e as próprias corujas, assim como o sistema visual do ratinho, que é diferente do dos humanos”, comentou o astrofísico David Galadí, investigador da Universidade de Córdova e co-autor do estudo.

“O nosso modelo indica que basta que a Lua se encontre sobre o horizonte em qualquer uma das suas fases para que uma coruja em voo possa aproximar-se dos roedores, permanecendo sempre abaixo do limiar de detecção do sistema visual do ratinho”, acrescentou.

Especificamente, o estudo mostra que a plumagem branca das corujas-das-torres serve como uma camuflagem eficaz, adaptada ao fundo do céu iluminado pela Lua, proporcionando uma nova base para compreender a camuflagem nocturna em outras espécies.

As implicações deste trabalho vão mais além da própria camuflagem, tal como explica Carlos Camacho, especialista no estudo de espécies nocturnas e investigador da Estação Biológica de Doñana. “As corujas mais claras e mais escuras podem escolher momentos diferentes para caçar, coincidindo com as condições lunares que maximizam a eficácia da caça de umas e de outras. Este desajuste temporal poderá dificultar o acasalamento entre corujas de cores diferentes, apesar de partilharem o mesmo espaço”, salientou.

O estudo sugere também que a crescente poluição luminosa poderá interferir com o funcionamento natural dos ecossistemas de formas inesperadas, porque aumenta o brilho do céu nocturno de um modo que neutraliza a camuflagem proporcionada pela plumagem branca das corujas e torna o predador mais visível para a sua presa.


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Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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