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Foto: Pexels/Pixabay

Índice Planeta Vivo: populações de espécies selvagens diminuíram 73% entre 1970 e 2020

10.10.2024

Apesar de há muito identificada, a crise da biodiversidade não dá mostras de abrandar. O relatório Índice Planeta Vivo revelado hoje diz que o tamanho das populações de vida selvagem monitorizadas diminuiu em média 73% nos últimos 50 anos. Alerta que temos cinco anos para mudar a atual trajetória.

O Índice Planeta Vivo (Living Planet Index), um relatório bianual, é feito para a WWF pela Sociedade Zoológica de Londres e foi publicado pela primeira vez em 1998.

Esta edição utilizou os dados sobre quase 35.000 populações de mamíferos, aves, peixes, répteis e anfíbios, representando 5.495 espécies, para monitorizar o declínio da vida selvagem.

Entre 1970 e 2020, período para o qual existe dados mais recentes, a dimensão das populações de vertebrados caiu em média 73%. Esta percentagem tem vindo a aumentar. Em 2014 era de 52% e em 2018 era de 60%, por exemplo.

O declínio mais acentuado acontece nos ecossistemas de água doce (-85%), seguido pelos terrestres (-69%) e, depois, marinhos (-56%).

Os maiores declínios nas populações monitorizadas foram registados na América Latina e Caraíbas (-95%), África (-76%) e Ásia-Pacífico (-60%).

Neste momento, a maior ameaça à biodiversidade por todo o mundo é a perda e degradação de habitat, impulsionadas principalmente pelo atual sistema alimentar. Mas há mais ameaças, como a sobre-exploração, as espécies invasoras e as doenças. As alterações climáticas são uma ameaça adicional para as populações de vida selvagem na América Latina e Caraíbas, que registaram uma queda média de 95%.

Entre as populações de espécies monitorizadas estão as tartarugas-de-pente da ilha de Milman, na Grande Barreira de Coral, na Austrália. O número de fêmeas a nidificar naquela ilha entre 1990 e 2018 registou uma queda de 57%. O relatório refere ainda a redução de 65% nos golfinhos cor-de-rosa da Amazónia e de 75% no tucuxi, entre 1994 e 2016, na reserva de Mamirauá, no Amazonas, Brasil. No ano passado, mais de 330 golfinhos de rio morreram em apenas dois lagos durante um período de calor extremo e seca.

O índice revela também que algumas populações estabilizaram ou aumentaram devido a esforços de conservação, como o aumento da subpopulação de gorilas-da-montanha em cerca de 3% por ano entre 2010 e 2016 nas montanhas Virunga, na África Oriental, e o regresso das populações de bisonte-europeu na Europa Central. “No entanto, sucessos isolados não são suficientes”, entende a WWF.

“A natureza está a lançar-nos um alerta”, comentou, em comunicado, Ângela Morgado, diretora executiva da ANPlWWF. “As crises da biodiversidade e alterações climáticas estão a empurrar a vida selvagem e os ecossistemas para além dos seus limites, com pontos de não retorno perigosos a ameaçar comprometer os sistemas vitais da Terra e a desestabilizar as sociedades. As consequências devastadoras de perdermos ecossistemas essenciais, como a floresta na Amazónia e os recifes de coral, serão sentidas tanto pelas pessoas como pela natureza em todo o planeta.”

O relatório alerta que, à medida que a Terra se aproxima de pontos de inflexão perigosos que representam graves ameaças para a humanidade, será necessário um enorme esforço coletivo nos próximos cinco anos para enfrentar as crises do clima e da natureza.

A ANP|WWF aponta a necessidade de Portugal conseguir sinergias entre a ação climática, a proteção da biodiversidade e o bem-estar humano, ressalvando que a aceleração das energias renováveis deve ocorrer de forma responsável e inclusiva. “Embora existam avanços no restauro de áreas degradadas e na criação de áreas protegidas, é essencial melhorar a gestão das áreas existentes e expandir a proteção em terra e no mar, com o objetivo de alcançar 30% de proteção efetiva até 2030”, considerou a associação.

“Em Portugal, em dia de entrega do Orçamento do Estado, seria crucial que as prioridades de conservação ambiental fossem de facto prioridades nacionais”, acrescentou Ângela Morgado. “É necessário um esforço de articulação entre Governo, grupos parlamentares e outras organizações para desbloquear maior financiamento público e privado que permitam ações em larga escala, mas também para alinhar melhor as suas políticas e ações de clima, natureza e desenvolvimento sustentável. Tanto os Governos quanto as empresas devem agir rapidamente para eliminar atividades com impactos negativos na biodiversidade e no clima, e redirecionar os financiamentos para práticas que cumpram os objetivos globais.”

No relatório lançado hoje, a ANP|WWF indica as prioridades para Portugal bem como alguns desafios que ainda estão por resolver, como o planeamento para a expansão de energias renováveis offshore, que carece de um enfoque que respeite os ecossistemas marinhos ou a transição justa, principalmente no combate à pobreza energética e de mobilidade, que requerem uma abordagem mais profunda no Plano Nacional de Energia e Clima. A organização também criticou o investimento na barragem do Pisão, alertando para os seus impactos negativos sobre a biodiversidade e a agricultura sustentável.

As cimeiras internacionais sobre biodiversidade e clima que se realizarão brevemente – COP16 (a Conferência das Partes da Convenção da ONU para a Diversidade Biológica, marcada para Cali, Colômbia, de 21 de Outubro a 1 de Novembro) e COP29 (Conferência da ONU para as Alterações Climáticas, a realizar em Baku, Azerbaijão, de 11 a 22 de Novembro) – “são uma oportunidade para os países se elevarem à dimensão do desafio”, segundo a organização.

A WWF apela aos países que produzam e implementem planos nacionais mais ambiciosos para a natureza e o clima, que incluam medidas para reduzir o consumo excessivo global, travar e reverter a perda de biodiversidade doméstica e importada, e reduzir as emissões − tudo de forma equitativa.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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