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Paisagem invadida por erva-das-pampas. Foto: LIFE Stop Cortaderia

Alerta para aumento descontrolado desta planta exótica invasora em Portugal

01.10.2024

Projecto que está a tentar travar expansão da erva-das-pampas (Cortadeira selloana) pede aos cidadãos que ajudem a mapear esta espécie e que peçam às autoridades municipais onde vivem para a controlar.

O combate contra a erva-das-pampas no nosso país não é de hoje nem de ontem. Mas travar a expansão desta planta cortante e alergénica é um desafio cada vez mais difícil.

Paisagem invadida por erva-das-pampas. Foto: LIFE Stop Cortaderia

A Wilder falou hoje com Hélia Marchante, responsável pelo projeto LIFE COOP Cortaderia no Instituto Politécnico de Coimbra (IPC) e investigadora que trabalha há vários anos com espécies exóticas invasoras.

“A situação é pior no litoral Norte; de Aveiro para cima é um terror”, comenta Hélia Marchante, também professora da Escola Superior Agrária de Coimbra, dando conta da proliferação da espécie em território nacional.

Originária da Argentina e do Chile – da região das Pampas, na América do Sul -, a erva-das-pampas chegou a Portugal como planta decorativa de jardins e quintais, mas hoje o seu crescimento no território está a ser alarmante. De tal modo que em 2018 foi lançado um projecto luso-espanhol na busca de soluções para este problema, o LIFE Stop Cortaderia, co-financiado pela União Europeia.

Foto: Hélia Marchante

No final de 2022 foi lançado um novo projecto para dar seguimento ao que terminou, o LIFE COOP Cortaderia, no terreno até Setembro de 2028. O grande objectivo é objetivo sensibilizar, educar / formar e promover a intervenção dos vários setores da sociedade de forma a gerir melhor a invasão biológica por erva-das-pampas, contando com a participação de parceiros espanhóis, franceses e portugueses.

Esta é uma das melhores alturas do ano para reforçar o alerta, dado que “é agora que esta planta está mais visível na paisagem”, com as suas plumas de cor clara, explica Hélia Marchante.

Podemos encontrá-la um pouco por todo o lado, em especial nas bermas das estradas e caminhos-de-ferro e em terrenos incultos. Mas também invade outros locais, como sapais, dunas ou mesmo o subcoberto de áreas florestais.

“Isto deve-se à sua excelente capacidade reprodutiva, que se traduz em milhões de sementes minúsculas por planta; às suas baixas exigências por recursos; à sua grande flexibilidade em termos de condições ecológicas onde consegue crescer; e, por vezes, à ausência de competição por outras espécies que (não) ocupam o território, devido à degradação das comunidades vegetais”, explica a investigadora. 

De fins de Setembro ao começo de Novembro, as sementes com origem nas flores femininas estão prontas a dispersar, pelo que as plumas ganham um aspeto ainda mais “fofo” e macio, onde os seus pêlos se “abrem” para serem levadas pelo vento.

Em cada pluma de uma planta feminina, ou seja, de um indivíduo desta espécie, concentram-se agora milhares de pequenas sementes. Cada indivíduo pode dispersar sementes que potencialmente germinam e originam milhares de novos indivíduos em cada época, traduzindo-se numa enorme capacidade de invasão.

Erva-das-Pampas (Cortaderia selloana). Foto: Forest & Kim Starr/Wiki Commons

Hélia Marchante salienta que, infelizmente, ainda há quem a use para decorar montras de lojas ou em casamentos, dada a sua beleza. E há quem tenha dificuldade em compreender quão perigosa pode ser.

Esta investigadora explica que esta planta é cortante e alergénica (para as vias respiratórias). “Os impactes negativos no estado de saúde da população, através das alergias que causa, é particularmente agravado por florir depois do verão, numa época em que menos espécies alergénicas costumam florir, sendo responsável por um novo pico de alergias, mais tardio.”

Mas, avisa, “os impactes negativos não se ficam por aí. Tem também impactes económicos associados ao seu controlo, particularmente nas faixas marginais às estradas, obrigando a despender recursos financeiros avultados. Adicionalmente, ao crescer sem controlo, a erva-das-pampas forma áreas homogéneas, nas quais é a única protagonista, impedindo as outras espécies e degradando os ecossistemas, e os benefícios que os mesmos nos dão.”

Na sua opinião, “torna-se urgente agir, enquanto sociedade, para parar esta catástrofe ambiental e as suas consequências sociais negativas”.

O LIFE COOP Cortaderia está a trabalhar há um ano para alargar a rede de parceiros neste combate, fazendo, por exemplo, acções de formação e consultoria, mas também campanhas de sensibilização junto de escolas e de municípios, por exemplo.

“Estamos a fazer uma tentativa para conquistar o compromisso sério das entidades para irem fazendo alguma coisa”, diz Hélia Marchante. E “já temos casos muito interessantes de municípios que conseguem controlar a erva-das-pampas”.

Folhas de erva-das-Pampas. Foto: David J. Stang/Wiki Commons

Além de intervenções de controlo e da aposta na sensibilização ambiental, este projeto convida entidades públicas e privadas a aderir à Estratégia Transnacional de luta contra a Cortaderia no Arco do Atlântico, oferecendo formação e consultoria profissional para melhorar a gestão da espécie com a finalidade de travar a sua expansão e, onde for possível, erradicar a sua presença.

Todos os Municípios, Comunidades Intermunicipais, Concessionárias de (Auto)Estradas, assim como outras entidades, incluindo Associações, ONG, empresas, etc. foram já contactadas e convidadas a aderir. Existem, até à data, 63 entidades portuguesas aderentes, de entre um total de 185 entidades em Portugal, Espanha e França.

Entre estas, Hélia Marchante destaca os municípios de Ílhavo, Leiria, Lousada, Soure e Vila Nova de Poiares, uns com ações de controlo, outros apostando na sensibilização dos cidadãos ou voluntariado para mapear a espécie ou remover as plumas. Estes exemplos “mostram que ainda que o desafio seja grande, é possível ganhar algumas batalhas!”.

No entanto, lamenta que “muitas entidades não chegaram sequer a responder ao convite de adesão e entre as aderentes há algumas que tardam em intervir de forma mais proativa permitindo o avançar da invasão da espécie com consequentes impactes negativos que se avolumam rapidamente”.

Hélia Marchante lança o repto: “se pertence a uma entidade pública ou privada que possui ou lida com esta espécie no seu território (ainda que pontualmente), pode juntar-se à Estratégia Transnacional, trabalhar em conjunto com parceiros que enfrentam o mesmo desafio, e passar a fazer a diferença usufruindo dos benefícios que o projeto lhe pode oferecer. Se, por outro lado, é um cidadão preocupado, pode controlar a espécie nos seus terrenos (se os tiver), deixar de usar a espécie, ou fazer pressão junto das entidades para que controlem esta (e outras) espécie invasora. Pode também divulgar o projeto COOP Cortaderia e a possibilidade de adesão à Estratégia junto de empresas, escolas, associações e, principalmente, dos agentes políticos locais (juntas de freguesia e municípios). Se for professor, temos ainda um programa de ciência cidadã no qual pode participar com grupos de alunos e contribuir ativamente para aumentar o conhecimento, o mapeamento e o controlo desta espécie: os 5 Desafios COOP CORTAderia, disponíveis em https://lifecoopcortaderia.org/desafios-corta-deria/”. 

Em alternativa, pode enviar as suas dúvidas para [email protected].

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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