Jogam computador, ‘playstation’ e futebol, como muitos outros jovens da mesma idade. Mas do que Miguel Berkemeier, 16 anos, e Gonçalo Almeida, 17, gostam mesmo é de registar e fotografar as espécies que encontram. Estes naturalistas, que até já descobriram uma espécie nova para Portugal, querem mostrar como se pode gostar da natureza ainda na escola.
Miguel e Gonçalo conheceram-se há cerca de três anos na Escola Secundária do Monte, no Monte da Caparica (concelho de Almada). “Andávamos na mesma escola e já tínhamos entrado em jogos de futebol, mas não sabíamos que gostávamos da mesma coisa”, diz Gonçalo à Wilder, no Parque Urbano da Costa da Caparica.
Em comum, têm desde muito novos uma enorme curiosidade por seres vivos – sejam aves, insectos, répteis, anfíbios ou mesmo aranhas.
Um dos seus passatempos preferidos, aliás, é registar e fotografar os animais que encontram, desde pequenos insectos até aves e mamíferos. Os momentos altos acontecem quando encontram espécies que nunca tinham sido registadas no concelho de Almada, onde vivem, ou mesmo em Portugal.
Esse último foi o caso de um pequeno díptero, ou mosca, que Miguel Berkemeier encontrou e fotografou no último Verão, na zona das Portas do Ródão. Como de outras vezes, recorreu à Internet para pedir ajuda a um especialista para a identificação, neste caso em insectos, que lhe indicou tratar-se de uma nova espécie para Portugal.
“Vamos muitas vezes à procura de aves, mas fotografamos tudo o que seja ser vivo”, conta Miguel, referindo-se aos percursos que fazem ali mesmo no Parque Urbano da Costa da Caparica e nas praias da zona.
Gostam também de explorar a Aroeira, a Mata dos Medos e a Arriba Fóssil, todos no concelho de Almada, ou então de ir mais longe, até à Lagoa de Albufeira (concelho de Sesimbra) ou ao Cabo Espichel. Muitas vezes à boleia dos pais, que também partilham o gosto pela natureza.
Recentemente, com o pai de Gonçalo, fizeram uma visita à zona de Pancas, na Reserva Natural do Estuário do Tejo, distrito de Santarém. Este foi um passeio que vai ficar na memória, tal como as espécies que viram e ouviram. “Noitibós, rolieiros, pardal-francês, chapins, trepadeiras, bufo-real, bufo-pequeno, alcaravão, coruja-do-mato, mocho-galego”, exemplificam com entusiasmo.
Quanto às aves, Miguel e Gonçalo enfrentaram-se muito tempo numa competição saudável, cada um alimentando a sua própria lista de espécies observadas. Finalmente juntaram tudo numa lista única, com um saldo muito positivo: para a zona da Costa da Caparica, Trafaria e Monte da Caparica, onde habitualmente passam mais tempo, somam “quase 180 espécies de aves registadas, incluindo algumas raridades”, conta Gonçalo Almeida.
E se por vezes amigos e colegas se metem com eles – porque procuram proteger um insecto que entrou distraído na sala de aulas ou pelas conversas diferentes no Facebook – têm a certeza de que o fascínio pelo mundo natural é contagiante. “Mostrar a natureza é importante. Os mais jovens pensam que é tudo igual, que não há biodiversidade”, avisa Miguel.
É por isso que os dois têm como projecto avançar com um clube para “agarrar em jovens dos 6 aos 15 anos e mostrar-lhes o que é a Natureza”, criando na Margem Sul uma filial do Clube Xzen. Esta organização, com sede no concelho de Odivelas, dedica-se desde 2012 à divulgação da biodiversidade e da ciência entre crianças e jovens. Em Novembro, ambos deram a sua primeira palestra naquele clube sobre o “mundo fabuloso da natureza e da biodiversidade”.
E como se imaginam daqui a alguns anos? Miguel, que está no 11º ano, quer tornar-se biólogo. Já Gonçalo, neste momento a tirar o curso de operador de sistemas informáticos, quer especializar-se em protecção civil e gestão ambiental e apostar num projecto de conservação florestal ligado aos bombeiros, onde é voluntário, na Trafaria.
Certo é que pretendem também continuar ligados à sensibilização ambiental.
A conversa com a Wilder termina com um pequeno passeio pelo Parque Urbano da Costa da Caparica.
Vamos vendo, muitas vezes apenas ouvindo, pintassilgos e rãs-verdes. No final, o percurso termina com uma boa surpresa, uma ave invernante raramente observada em Portugal: três ou quatro estrelinhas-de-poupa são avistadas nos ramos de um pinheiro, já fora dos limites do parque. E pelo menos uma deixa-se fotografar.