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Líderes mundiais pedem medidas urgentes para travar seca e desertificação

17.06.2022
Foto: Racaille1950/WikiCommons

No Dia Mundial de Luta contra a Desertificação e Seca, a 17 de Junho, peritos e líderes mundiais reuniram-se em Madrid, sob a égide da ONU, para pedir medidas urgentes. Em Portugal, a Quercus pede um reforço do investimento público para combater a seca e a degradação dos ecossistemas.

Peritos e líderes políticos debateram medidas e soluções para combater a desertificação e a seca numa jornada de alto nível celebrada hoje no Museu Nacional espanhol Reina Sofía, em Madrid, organizada pelo Ministério espanhol para a Transição Ecológica e Desafio Demográfico (MITECO), em colaboração com o Secretariado da Convenção da ONU para a Luta contra a Desertificação (UNCCD, sigla em Inglês).

Hoje, a degradação do solo e a escassez de água disponível são problemas graves que afectam cada vez mais pessoas no mundo.

Este ano, o Dia Mundial celebra-se com o tema “Superando a seca juntos” e baseia-se na urgência de adoptar políticas e medidas às escalas local, regional e mundial para evitar os efeitos da desertificação e seca e na criação de sociedades mais resilientes.

As celebrações contaram com a presença, entre outros, do secretário-geral da ONU, António Guterres, do presidente do Governo espanhol, Pedro Sánchez, do secretário executivo da UNCCD, Ibrahim Thiaw, e do comissário europeu do Ambiente, Oceanos e Pesca, Virginijus Sinkevičius.

Pedro Sánchez anunciou o lançamento da iniciativa de colaboração “Restaurando paisagens e água para a adaptação e resiliência” que vai reforçar os vínculos com África para lutar contra a desertificação no continente. Nas suas palavras, a luta contra a desertificação e seca é um dos desafios deste século. “Poucas coisas são mais urgentes do que trabalharmos para tornar o nosso planeta num lugar habitável.”

António Guterres, que fez uma intervenção através de um vídeo, recordou que as secas são cada vez mais frequentes e intensas em todas as regiões do globo. “O bem-estar de centenas de milhões de pessoas vê-se comprometido por cada vez mais tempestades de areia, incêndios florestais, colheitas fracas, deslocamentos e conflitos.”

Na sua opinião, “grande parte da responsabilidade recai nas alterações climáticas mas também na forma como gerimos as nossas terras. Cuidar das nossas terras e da sua biodiversidade pode ajudar-nos a enfrentar a crise climática e alcançar os nossos Objectivos de Desenvolvimento Sustentável”.

“Nenhuma nação, rica ou pobre, está imune à seca e todos os países podem tomar medidas para evitar os efeitos devastadores das secas na vida e nos meios de subsistência das pessoas”, disse Ibrahim Thiaw. “Ainda que tenhamos feito alguns progressos, não são suficientes.”

“A seca é um perigo natural mas não tem de ser um desastre. Apelamos a todos os países para que a celebração mundial deste ano seja um momento crucial onde nos comprometemos a trabalhar juntos para restaurar as nossas terras, proteger os recursos naturais e aumentar a resiliência das comunidades perante a seca.”

A desertificação é a degradação das terras e traz importantes impactos económicos, sociais e ambientais, como a perda da produtividade dos solos, o aumento do despovoamento de zonas rurais e a perda de biodiversidade.

Estima-se que entre 1900 e 2019, as secas tenham afectado 2.700 milhões de pessoas em todo o mundo e tenham causado 11,7 milhões de mortes. Além disso, as previsões da comunidade científica apontam para que a seca afecte mais de três quartos da população mundial até 2050.

A nível global, segundo as Nações Unidas, devido às secas e desertificação, 12 milhões de hectares são perdidos todos os anos (a um ritmo de 23 hectares por minuto).

A desertificação em Portugal

Segundo o Programa de Nacional de Acção de Combate à Desertificação, 32,6 % do território nacional está em situação degradada e 60,3% está em condições razoáveis a boas. A aridez dos solos atinge a totalidade do interior Algarvio e do Alentejo, está a progredir para as zonas do noroeste, tradicionalmente uma das mais pluviosas da Europa, e a aumentar nas zonas do litoral sul e montanhas do Centro.

A Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza lembra hoje, em comunicado, que “os solos degradados armazenam menos carbono, o que contribui para os efeitos das alterações climáticas, e além disso, os países mais afetados e vulneráveis à desertificação são, na sua maior parte, os mais pobres e menos desenvolvidos do mundo. Sem solos saudáveis e produtivos surge a pobreza, a fome e a necessidade de emigração, que muitas vezes gera conflitos e problemas humanitários gravíssimos”.

Mas não é só nos países menos desenvolvidos que existe desertificação. Na Europa, em virtude das profundas alterações ocorridas durante as últimas décadas nas áreas rurais, os modelos tradicionais de gestão agro-silvo-pastoril sofreram profundas transformações e o valor económico e social da terra sofreu profundas transformações, que em muitos casos se traduziram na degradação dos solos e no consequente abandono da terra.

A Quercus aponta uma cadeia de fatores que contribuem para este fenómeno de aumento da aridez e desertificação em Portugal, além da suscetibilidade natural de algumas regiões: as culturas agrícolas intensivas de regadio; a (re)arborização de milhares de hectares das florestas com espécies exóticas e consequente perda de biodiversidade; os incêndios e os problemas socioeconómicos, que afastam as pessoas do interior para as cidades do litoral, deixando as terras ao abandono.

Por isso, a direcção nacional da Quercus “apela ao diálogo, ao compromisso e à ação de todos os parceiros dos vários quadrantes da sociedade (Governo, produtores agrícolas e florestais, empresas, indústria, sociedade civil) que, direta ou indiretamente, podem contribuir para a diminuição da desertificação dos ecossistemas através da utilização sustentável dos recursos naturais”.

“É urgente regenerar os ecossistemas terrestres, preservar os solos e os recursos hídricos. É urgente implementar políticas de combate à desertificação do território.”

A Quercus pede medidas e legislação específica que proteja os últimos exemplares e bosquetes de carvalhos autóctones; que obrigue à existência de uma floresta multifuncional e à compartimentação da floresta, de forma a quebrar a continuidade de monoculturas; que condicione as áreas de implementação de culturas agrícolas intensivas de regadio em zonas de montados de sobro e azinho, cujo declínio urge inverter; que regulamente ações de remediação em solos ameaçados ou já contaminados com medidas adequadas à sua atenuação, eliminação e/ou recuperação; e que contemple um modelo de gestão ecológica do território, nomeadamente a urgente revisão dos critérios para as faixas de gestão de combustível que deveria ter sido publicada em Janeiro deste ano.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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