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Veados, lobos e javalis estão a regressar a Tchernobil

06.10.2015

A explosão na central nuclear de Tchernobil, em 1986, obrigou milhares de pessoas a abandonarem a região na Ucrânia. Agora, quase 30 anos depois, o local do pior acidente nuclear da História passou a ser um refúgio para espécies como veados, javalis e lobos, revelam os cientistas que fizeram um censo à biodiversidade da zona.

 

A 26 de Abril de 1986, a explosão de alguns reactores nucleares da central de Tchernobil libertou para a atmosfera grandes quantidades de radioactividade. Na sequência do acidente, 116.000 pessoas abandonaram a região e foi declarada uma zona de exclusão de 30 quilómetros, que incluiu Prypyat, a cidade mais próxima da central. Desde então, o local tem estado ao abandono, devendo assim continuar até que o território seja considerado livre de radioactividade. O Ministério ucraniano da Economia chegou a estimar que que serão precisos mais 570 anos.

Ontem, uma equipa de cientistas publicou um artigo na revista científica Current Biology sobre o que tem acontecido à abundância de vida selvagem, especialmente grandes mamíferos. Durante anos, os animais têm sido estudados, quer por censos feitos por helicóptero sobre a zona, quer pela contagem de vestígios deixados na neve, no Inverno.

 

Corços perto da central nuclear de Tchernobil. Foto: Tatyana Deryabina

 

“É muito provável que hoje a quantidade de animais selvagens em Tchernobil seja muito maior do que antes do acidente”, disse Jim Smith, da Universidade de Portsmouth, no Reino Unido e coordenador do estudo. “Isto não quer dizer que a radioactividade seja boa para a vida selvagem, apenas que os efeitos das comunidades humanas – incluindo a caça, agricultura e produção florestal – são muito piores.”

Estudos anteriores mostraram que a radioactividade reduziu significativamente as populações de animais selvagens na zona de exclusão. Agora, um censo de longa duração – que, ainda assim, não estudou os efeitos da radiação da saúde dos animais – conclui que as populações de mamíferos estão a reagir e a regressar.

A abundância relativa de duas espécies de veados, corços e javalis dentro da zona de exclusão é hoje semelhante à abundância registada noutras quatro reservas naturais não contaminadas na região, descobriram os investigadores.

Já para os lobos, a situação é ainda mais surpreendente. Segundo os cientistas, o número de lobos que vivem dentro e em redor da região de Tchernobil é mais de sete vezes maior do que naquelas quatro reservas naturais.

 

Casa abandonada perto da central nuclear. Foto: Valeriy Yurko

 

“Estes resultados mostram, pela primeira vez, que, independentemente dos potenciais efeitos da radiação nos animais, a zona de exclusão de Tchernobil suporta uma abundante comunidade de mamíferos depois de quase três décadas de exposição crónica à radiação”, concluem os investigadores.

Há mais de 20 anos que Tatiana Deryabina, da Polessye State Radioecological Reserve na Bielorrússia, tem trabalhado naquela zona. “Tenho tirado fotografias à fantástica vida selvagem da zona de Tchernobil e estou muito satisfeita pelo nosso trabalho ter chegado à comunidade científica internacional”, comentou, em comunicado.

Para Jim Beasley, co-autor e investigador na Universidade de Georgia, estes dados “ilustram a resiliência das populações de animais selvagens quando libertadas das pressões impostas pelo ser humano”.

Ainda assim, este estudo deixou de fora animais mais pequenos. “Este estudo aplica-se apenas aos grandes mamíferos sob pressão da caça e não à maioria dos animais – aves, pequenos mamíferos e insectos – que não são influenciados directamente pelas comunidades humanas”, lembrou à BBC News Tim Mousseau, da Universidade da Carolina do Sul, investigador que estuda há anos os efeitos da radiação na saúde das aves na zona de exclusão.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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