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Foto: Joana Bourgard / Wilder

Sibecol, a nova Sociedade Ibérica para a Ecologia

03.08.2018

Ajudar a travar o contrabando de meixão, mapear plantas exóticas invasoras e estudar morcegos para recuperar paisagens fragmentadas são exemplos de como os ecólogos em Portugal estão a ajudar a sociedade. Para reforçar o seu papel, mais de 50 cientistas portugueses e espanhóis fundaram a 2 de Julho a Sociedade Ibérica de Ecologia (SIBECOL). Maria Amélia Martins-Loução, presidente da Sociedade Portuguesa de Ecologia (SPECO), explicou à Wilder o por quê e o que se vai fazer.

 

WILDER: O que pode a sociedade em geral esperar da SIBECOL?

Maria Amélia Martins-Loução: a criação desta nova sociedade vai permitir impulsionar actividades conjuntas que possam melhorar a gestão da natureza sem fronteiras e mitigar o impacto negativo da exploração desregrada dos ecossistemas e recursos. Vai ainda desenvolver iniciativas de ligação directa com a administração local e regional para levar informação e apoio científicos na tomada de decisões ligadas ao Ambiente.

 

W: Por que sentiram os ecólogos portugueses e espanhóis a necessidade de criar uma sociedade?

Maria Amélia Martins-Loução: Já há muito sentíamos necessidade de juntar valências e aumentar a massa crítica dos ecólogos ibéricos, perante uma comunidade internacional cada vez mais competitiva. Acredito que a SIBECOL vai permitir uma maior projecção internacional das investigações e um maior peso na defesa dos valores ecológicos e da sustentabilidade ambiental e social a nível ibérico. Cada vez mais, e perante a alteração global que hoje assistimos, esta colaboração é fundamental para combater, de forma estruturada, os objectivos científicos e sociais consagrados na Agenda 2030. Importa lembrar que a Península Ibérica é um hotspot de biodiversidade, terrestre e marinha, com fortes e complexas interacções entre os meios terrestres, aquáticos continentais e marinhos. Estes são factores que tornam imprescindível o trabalho conjunto de ecólogos marinhos e terrestres, espanhóis e portugueses, para preservar os valores naturais, os serviços que a natureza nos presta, e a melhoria da sustentabilidade das acções humanas.

 

canoa no rio tejo
Foto: Joana Bourgard

 

W: Quem faz parte da SIBECOL e que tipo de áreas de trabalho engloba esta nova sociedade?

Maria Amélia Martins-Loução: A SIBECOL nasce com a associação de três associações fundadoras – a Asociación Española de Ecología Terrestre (AEET), a Asociación Ibérica de Limnología (AIL), a Sociedade Portuguesa de Ecología (SPECO) e a Sociedad Española de Etología y Ecología Evolutiva (SEEEE) -, com o apoio de uma importante representação da comunidade de científicos/as marinhos espanhóis que ainda não estavam integrados em nenhuma sociedade espanhola. As áreas de trabalho são diversificadas, desde a ecologia de laboratório e molecular, à ecologia de campo, satélites e modelos.

 

W: E quais são as prioridades e os primeiros projectos desta nova Sociedade?

Maria Amélia Martins-Loução: Vamos organizar actividades educativas e científicas sobre ecologia e Ambiente, criar grupos de trabalho para o desenvolvimento de conhecimentos e métodos, ou a gestão de publicações e outros sistemas de divulgação através das revistas científicas Ecosistemas, Ecologi@, Limnetica e Scientia Marina. A grande projecção da SIBECOL será um congresso fundacional a ter lugar de 4 a 7 de Fevereiro de 2019, coincidindo com o centenário do nascimento de Ramón Margalef, considerado pioneiro e “pai” da ecologia em Espanha. O evento realiza-se na Universitat de Barcelona (UB), lugar onde o insigne ecólogo desempenhou o seu trabalho como docente e investigador.

 

W: Como é a colaboração científica actual entre Portugal e Espanha em relação à Ecologia?

Maria Amélia Martins-Loução: A colaboração já é longa. Existe um forte intercâmbio de investigadores entre os dois países desde há muitos anos, para além da submissão conjunta de projectos inter-regionais e europeus. Em termos de actividades teve início com a organização de congressos ibéricos entre a Associação de Ecologia Terrestre Espanhola (AEET) e a Sociedade Portuguesa de Ecologia (SPECO). O primeiro encontro teve lugar em Santiago de Compostela em 2000. Ao longo destes 18 anos muitos outros se sucederam, de dois em dois anos. Mas a formalização e trabalho direccionado para a concretização desta nova sociedade tem menos de um ano e envolveu mais de 50 investigadores das quatro sociedades fundadoras, assim como de biólogos marinhos espanhóis.

 

Foto: Joana Bourgard

 

W: De que forma os ecólogos portugueses estão a ajudar a resolver os problemas de conservação? 

Maria Amélia Martins-Loução: São vários os exemplos de investigação científica que os ecólogos portugueses estão a desenvolver para mitigar os problemas que afectam os nossos recursos naturais, em ecossistemas diferentes. Por exemplo, o CESAM (Centre for Environmental and Marine Studies) da Universidade de Aveiro, tem estudado os sapais do Baixo Vouga Lagunar para mostrar qual o papel destes ecossistemas prioritários para a sociedade e das consequências para a fauna e flora das alterações climáticas e da acção do homem. O trabalho dos investigadores do MARE (Centro de Ciências do Mar e do Ambiente, consórcio nacional que envolve investigadores de diferentes universidades nacionais) permitiu detectar casos e apoiar a investigação criminal sobre o contrabando dos meixões e sua consequente delapidação das suas comunidades. Em Coimbra, no CFE (Centro de Ecologia Funcional da Universidade de Coimbra) há um grupo de investigadores que, desde há longos anos, desenvolve a sua investigação sobre as espécies vegetais invasoras. Este estudo de base tem permitido o desenvolvimento de trabalhos de ciência cidadã e de mapas de distribuição de apoio à gestão ambiental. Um dos jovens investigadores do cE3c (Centro de Ecologia, Evolução e Alterações Ambientais, da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa) tem desenvolvido modelos biológicos a partir do estudo de comunidades de morcegos tropicais para avaliar o impacto da fragmentação de habitats, tendo em conta o espaço e o tempo, factores fundamentais em ecologia. Os resultados obtidos têm contribuído, de forma significativa, para o desenvolvimento de estratégias de gestão e regeneração de paisagens fragmentadas e desta forma mitigar algum do pesado legado deixado pela nossa espécie naquelas que são os bastiões de biodiversidade terrestre do planeta, as florestas tropicais.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

A SIBECOL foi oficialmente constituída a 2 de Julho de 2018, na sua sede, o Instituto de Ciências do Mar (Conselho Superior de Investigação Científica, CSIC) em Barcelona.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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