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Esta equipa salvou mais de 200 animais selvagens em 2017

22.01.2018

Corujas, raposas, ouriços-cacheiros e sapos foram alguns dos 526 animais recebidos em 2017 no CERVAS (Centro de Ecologia, Recuperação e Vigilância de Animais Selvagens), na Serra da Estrela. A Wilder falou com o director do centro que salvou mais de 200 desses animais.

 

Em 2017 entraram pelas portas do CERVAS 526 animais: 442 aves (de 78 espécies), 70 mamíferos (de 13 espécies) e 14 répteis e anfíbios (de quatro espécies). Dos 526 animais, apenas 388 animais estavam vivos na altura do seu ingresso.

Ao longo do ano foram recuperados e devolvidos à natureza 229 animais, representando 56,1% do total dos animais que entraram no centro, de acordo com o relatório de actividades do centro de 2017, divulgado a 19 de Janeiro.

 

Devolução à Natureza de bufo-real (Bubo bubo) em Cantanhede

 

Os animais que mais ocuparam esta equipa em 2017 pertencem a 10 espécies: andorinhão-pálido (Apus pallidus), águia-de-asa-redonda (Buteo buteo), mocho-galego (Athene noctua), andorinhão-preto (Apus apus), melro-preto (Turdus merula), coruja-do-mato (Strix aluco), coruja-das-torres (Tyto alba), raposa (Vulpes vulpes), gralha-preta (Corvus corone) e milhafre-preto (Milvus migrans).

“Estas foram as 10 espécies que mais recebemos”, disse à Wilder Ricardo Brandão, coordenador e director clínico do CERVAS, onde actualmente estão 35 animais. “Os animais vieram, principalmente, dos distritos da Guarda (188), Coimbra (183) e Viseu (106).”

 

 

Sessão de alimentação (forçada) de um flamingo (Phoenicopterus roseus) que tinha sido predado por um cão assilvestrado na Ria de Aveiro

 

Estes números são apenas uma parte da realidade dos milhares de animais selvagens que, todos os anos, são recolhidos de Norte a Sul do país – por vigilantes da natureza, guardas do SEPNA (serviço de ambiente da GNR), organizações não governamentais e cidadãos preocupados – e que são recebidos nos centros da Rede Nacional de Centros de Recuperação para a Fauna.

No CERVAS, um dos 10 centros dessa rede nacional de hospitais de animais selvagens de Portugal, trabalham a tempo inteiro um médico veterinário e uma enfermeira veterinária. Em 2017, esta equipa teve a ajuda de seis voluntários regulares – maioritariamente estrangeiros que vivem em Gouveia, Seia e Celorico da Beira -, de 20 voluntários, sobretudo estudantes em período de férias e de 10 estagiários.

 

Andorinhão

 

As principais causas de entrada no CERVAS foram a queda dos ninhos (147) e o atropelamento (98).

 

Menos animais de cativeiro e menos corujas e mochos

O ano de 2017 ficou marcado pela diminuição no número de animais no CERVAS, dos 582 de 2016 para 526. Segundo Ricardo Brandão, por um lado houve menos ingressos devido a cativeiro ilegal (118 para 19) e, por outro, houve menos ingressos de corujas e mochos (116 para 73).

“Em 2016 houve uma grande apreensão de animais que estavam em cativeiro ilegal, o que inflaccionou os números totais”, acrescentou. “No ano passado, os casos de cativeiro ilegal parecem ter diminuído um pouco, o que pode ser uma boa notícia.”

 

Cria de raposa (Vulpes vulpes) em recuperação após ter sido apreendida a um particular que a mantinha em cativeiro ilegal

 

Mas o decréscimo das entradas das rapinas nocturnas preocupa Ricardo Brandão. “Ainda não podemos ter certezas, mas esta redução acompanha a redução de aves observadas na natureza, o que é preocupante.”

Por exemplo, as corujas-das-torres estão a perder os seus locais preferidos para fazerem ninhos, em habitações abandonadas ou em ruínas. Há muitos casos de remoção de ninhos, com impactos para esta rapina nocturna. Outro dos perigos para estas corujas e para as outras rapinas nocturnas é o atropelamento. “Estas aves usam as estradas como áreas de caça, por ser mais fácil detectar ratinhos, por exemplo. Muitas vezes, as estradas estão muito perto dos campos agrícolas onde caçam. Tudo isto torna-as vulneráveis.”

 

Sessão de alimentação (com leite) de uma cria de coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus) que tinha sido predada por um cão

 

Quando olha para 2017, Ricardo Brandão não esquece os incêndios. “Nos outros anos não costumamos receber animais afectados pelo fogo, mas no ano passado recebemos nove”, contou. “Recebemos ginetas, fuinhas, lebres com queimaduras no corpo e com a visão perdida. Recebemos também um corço que acabou atropelado quando tentava escapar ao fogo. Um pequeno pisco-de-peito-ruivo chegou-nos às mãos, queimado. Conseguiu sobreviver apenas dois dias.”

Destes nove animais atingidos pelos incêndios, apenas um recuperou, uma águia-de-asa-redonda. Tinha as patas queimadas e uma fractura na clavícula. Hoje está quase recuperada e em fase de treino para a liberdade.

Outra boa notícia do CERVAS em 2017 foi a rápida recuperação do abutre-do-egipto (Neophron percnopterusPoiares. Esta era uma fêmea que foi levada para o CERVAS debilitada e com pouco peso.

 

Fêmea adulta de britango (ou abutre do Egipto) (Neophron percnopterus), a “Poiares”, em recuperação no CERVAS antes da marcação com GPS e devolução à Natureza no âmbito do projecto LIFE Rupis

 

“A ave estava em plena época de reprodução e, provavelmente, teria crias. Por isso tínhamos de ser rápidos. Esteve menos de uma semana em recuperação” e acabou por ser libertada em Freixo-de-Espada-à-Cinta. “Conseguimos saber que, durante a sua ausência, o macho cuidou da cria, que conseguiu sobreviver. A Poiares ainda regressou a tempo ao ninho para acabar de cuidar da sua cria. Sabemos, graças a seguimento por GPS, no âmbito do projecto LIFE Rupis, que hoje está no Mali”, contou Ricardo Brandão.

Na verdade, a libertação dos animais na natureza é um dos pontos altos do trabalho no centro. Em 2017 foram feitas 180 acções de devolução à natureza de animais selvagens recuperados, envolvendo 5.380 pessoas.

 

Devolução à Natureza de dois ouriços-cacheiros (Erinaceus europaeus) em Moimenta da Serra, Gouveia, durante uma festa de aniversário

 

Para este novo ano, o grande objectivo é “tentar garantir a recuperação dos animais selvagens e divulgar melhor a fauna da região”.

Dentro de poucos meses, o CERVAS estará a funcionar ao máximo. O pico de ingressos costuma acontecer no final da Primavera e Verão, quando chega a ter 120 animais. Actualmente estão no centro 35, cinco dos quais já entraram em 2018. “Esperamos conseguir manter os patrocinadores e os mesmos recursos e meios” para este ano, disse Ricardo Brandão.

O CERVAS é uma estrutura que pertence ao Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) / Parque Natural da Serra da Estrela (PNSE) e que desde 27 de Março de 2009 está sob a gestão da Associação ALDEIA (www.aldeia.org), com o apoio da ANA – Aeroportos de Portugal e outros parceiros.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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