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Paul de Tornada, a casa dos cágados selvagens

03.08.2015

As lagoas e os campos da Reserva Natural Local do Paul de Tornada são um refúgio crucial para as duas espécies de cágados selvagens do país. Entre Abril e Julho decorreu um censo para os conhecer melhor.

 

Basta percorrer apenas cinco quilómetros desde a cidade das Caldas da Rainha (Leiria) para chegarmos aos 45 hectares do Paul de Tornada. E aos cágados-de-carapaça-estriada (Emys orbicularis) e aos cágados-mediterrânicos (Mauremys leprosa). Logo à partida, uma coisa que os distingue é que estes últimos são muito maiores do que os primeiros.

 

Cágado-mediterrânico. Foto: Ana Filipa Ferreira

 

É aqui nesta reserva natural sobre o leito do rio Tornada, onde 25 hectares estão alagados todo o ano, que vivem as duas únicas espécies de cágados autóctones de Portugal.

O cágado-de-carapaça-estriada está Em Perigo de Extinção por causa da perda do habitat, da concorrência de espécies exóticas, da poluição e captura para fins comerciais; o cágado-mediterrânico não está ameaçado mas a perda de habitat é um problema que poderá levar a um declínio populacional. Este último é muito maior do que o primeiro.

 

Cágado-de-carapaça-estriada. Foto: Ana Filipa Ferreira

 

“O paul de Tornada é um dos raros sítios a Norte do rio Tejo onde ocorrem populações de cágado-de-carapaça-estriada”, disse à Wilder Ana Filipa Ferreira, bióloga de 28 anos e vice-presidente da PATO (Associação de Defesa do Paul de Tornada), uma das entidades que gere a reserva. “Por isso, este é um local de elevada importância conservacionista para os cágados em Portugal.” E também porque é um dos poucos locais do país onde podemos encontrar as duas espécies.

São as águas doces permanentes, paradas ou de corrente lenta, que fazem do Paul de Tornada um lugar especial. Estas zonas são utilizadas por estes animais como “áreas de alimentação, de refúgio e protecção, ou ainda como pontos para exposição solar e locais de postura”, acrescentou.

Nesta altura do ano, as fêmeas estão a fazer as posturas. Escavam um fosso que cobrem de terra depois da postura, mesmo em locais bastante afastados da água. Será no final do Verão ou no início do Outono que os pequenotes emergem dos ninhos.

 

Um censo à população de cágados do paul

 

As populações de cágados do paul têm sido monitorizadas esporadicamente desde 1996. A última contagem aconteceu entre Abril e Julho deste ano. “Colocámos 12 armadilhas distribuídas pelo paul, nomeadamente nas margens do lago principal e pelas valas”, explicou a bióloga.

 

Medição do comprimento e largura das carapaças. Foto: PATO

 

Foram contados mais de 50 cágados-de-carapaça-estriada e quase 400 cágados-mediterrânicos. A equipa, liderada por Ana Filipa, capturou os animais para medir o comprimento e a largura da carapaça, para determinar o sexo e para marcar os animais com uma marca individual. “É para quando fizermos recapturas conseguirmos identificar os indivíduos.”

A contagem faz parte do projecto “Ecologia e Conservação das Tartarugas de Água Doce do Paul de Tornada”, que começou este ano e que, em Março, ficou em segundo lugar no Prémio Yves Rocher Terre de Femmes.

O objectivo da iniciativa, que terminará na Primavera de 2016, é conhecer melhor estes animais e sensibilizar os cidadãos para o que pode ser feito para os ajudar. Nomeadamente não libertar tartarugas exóticas na natureza e não capturar os cágados autóctones.

 

Libertação dos animais após monitorização. Foto: PATO

 

A relevância de conhecer bem estas populações do paul, um “importante refúgio a nível nacional”, é tanto maior quando se sabe que há uma forte pressão humana na região.

Ana Filipa Ferreira lembra que as populações do paul estão vulneráveis. “Há factores negativos, nomeadamente a captura de cágados para animais de estimação, a presença de espécies exóticas (de tartarugas e outras espécies como o lagostim-vermelho-do-Louisiana, Procambarus clarkii) e a própria qualidade da água, que ainda é frequentemente baixa.”

Além disso, “também é elevado o desconhecimento que ainda existe, não só relativamente aos animais, como aos factores que os poderão estar a afectar”.

O futuro das monitorizações dos cágados do paul não está garantido. “A monitorização que realizámos beneficiou da existência de estagiários e de voluntários e também do financiamento por parte de diversas entidades. A continuação da realização deste trabalho está, por isso, altamente dependente dos recursos humanos que estiverem disponíveis”.

 

[divider type=”thin”]Agora é a sua vez.

Este ano as monitorizações de cágados já terminaram. No entanto, se estiver interessado em ajudar, a associação PATO recebe voluntários em praticamente todas as actividades que desenvolve no Paul de Tornada. Quem estiver interessado deve entrar em contacto com a associação através do email [email protected], para ficar a conhecer em que actividades poderá participar.

E pode ficar a saber mais sobre estes animais aqui, no artigo “Seis coisas a saber sobre cágados”.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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