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Cinco perguntas às autoras do livro “Lá Fora”

05.01.2015

Maria Dias e Inês Teixeira do Rosário são biólogas e autoras do livro “Lá Fora”, uma obra que procura inspirar crianças e adultos, em Portugal, a descobrirem mais sobre o mundo natural que os rodeia. Depois do nosso passeio, conversámos com as duas.

Wilder – Como começaram a interessar-se pela natureza?

Inês Teixeira do Rosário – Na escola gostava muito da disciplina de Biologia, mas não na vertente mais naturalista. Gostava de decorar aqueles bichos todos e de ver os aparelhos reprodutivos e respiratórios. Só me comecei a interessar pela natureza na faculdade.

Maria Dias – Partilho completamente as palavras da Inês. Só mesmo na faculdade é que tive noção da diversidade e do trabalho que se fazia em Portugal. Sempre gostei muito de bicharada, mas nunca com aquele interesse de ir para o campo. Na faculdade conhecemos colegas, começámos a ir para o campo e a ajudar os outros que estavam a fazer estágios. No meu caso, fui ajudar a Inês que estava a trabalhar com camaleões. E era tudo muito giro, ir para o campo e ver passarinhos e lagartos, aprender as espécies.

Inês Teixeira do Rosário – Isso cria também uma cumplicidade entre as pessoas, por causa da partilha desses momentos na natureza. E ainda hoje, sempre que podemos, numa passagem de ano por exemplo, levamos os nossos filhos e fazemos uma saída de campo.

W – Quais são os vossos sítios favoritos?

Inês Teixeira do Rosário – Gosto muito da Mata da Machada (na Península de Setúbal) e dos luxuriantes montados na serra de Grândola. Lá, porque há mais declive, existem locais onde se forma um bosque mais desenvolvido, com árvores antigas, medronheiros e também mais matos no sub-bosque. Outro sítio favorito em Portugal é Montesinho, em Trás-os-Montes. A paisagem é espectacular. É muito bonito no Outono, com o vermelho e dourado das folhas que ficam nas árvores até ao rebentamento das novas, mais tarde na Primavera. E, por causa das suas aldeias e pessoas, é um local muito genuíno.

Maria Dias – Para mim, a zona de Castro Verde, no Alentejo, é espectacular. Os ornitólogos consideram-na uma espécie de “Meca” em Portugal por causa das espécies que se vêem lá facilmente e não se conseguem ver noutros sítios, como as abetardas. A paisagem está muito transformada, por causa da agricultura. Ainda assim, acho muito bonito os campos cheios de papoilas e de flores de soagem quando chega a Primavera. Também associo Castro Verde aos colegas com quem aprendi muito sobre trabalho de campo, como por exemplo, a fazer anilhagem. Também gosto muito do Gerês, com a sua paisagem grandiosa e mais húmida, da Lagoa de Albufeira e de Sintra. No tempo da faculdade juntávamos um grupo de amigos e lá íamos nós à Peninha ver a ferreirinha-alpina (Prunella collaris), que é uma espécie de ave relativamente rara.

W – E qual é a vossa estação do ano preferida para estes passeios na natureza?

Maria Dias e Inês Teixeira do Rosário – A Primavera.

Inês Teixeira do Rosário – Se pensarmos nas plantas, é claro que a Primavera é a estação ideal. Os campos enchem-se de flores. Mas a preferência por esta estação é mais por conforto nosso, pelo hábito que temos de sair só quando está Sol e não há muito vento. Não é que não estejam a acontecer coisas noutras alturas. Por exemplo, é muito melhor ver aves nos estuários durante o Inverno. Mas a maioria das pessoas, se forem lá nessa altura, nem sequer saem do carro porque está frio e a chover. E depois acham que não se passa nada. Outro exemplo são os anfíbios, que começam a sair com as primeiras chuvas. E é no Verão, quando começa a estar muito calor, que eles se escondem, pelo menos a maior parte das espécies.

Maria Dias – O Outono era a minha estação preferida. Mas deixou de o ser depois do meu doutoramento com aves invernantes (risos). É completamente diferente irmos para o campo porque nos apetece, em passeio com um grupo de amigos, ou irmos para o campo todos os dias, debaixo de chuva e para fazer um trabalho monótono. De início é engraçado, mas deixa de o ser passado uma semana, depois de acordar todos os dias às 5 horas da manhã no Outono ou no Inverno, com frio e chuva. Comigo foi precisamente isso que aconteceu.

W – E quando vão passear, quais são as espécies que mais gostam de ver?

Inês Teixeira do Rosário – Gosto muito dos anfíbios. Para já, acho os animais giros e depois, como há relativamente poucas espécies, são mais fáceis de aprender a identificar. Além disso, facilmente se pode ir a um sítio específico onde há água, procurar uma determinada espécie e encontrá-la e observá-la de perto. Se calhar para algumas pessoas não é interessante, mas para os miúdos…

Maria Dias – Gosto também imenso de anfíbios e de répteis, sobretudo de anfíbios. Mas adoro ver mamíferos. Quando vejo uma raposa no campo é uma emoção. Mas é uma coisa mais rara. E gosto muito de aves, como é óbvio. As espécies que estudo agora são as aves marinhas, sem dúvida nenhuma o grupo de aves mais fascinante para mim. Como as aves marinhas criam colónias densas e relativamente isoladas (nas Ilhas Selvagens ou nas Ilhas Malvinas, por exemplo), sentes-te um elemento completamente estranho. Normalmente, na maior parte dos sítios, uma pessoa vai para o campo e a sua presença parece que é muito marcada. Numa colónia de aves marinhas, estamos no meio das aves e estas não te ligam nenhuma, nem sequer fogem, ficam ali. Algumas até são curiosas e vêm ver o que és, mas continuam com a sua vida.

W – Costumam ler sobre natureza fora do trabalho?

Maria Dias – Há um livro de que gostei muito e li-o como se fosse um romance. Chama-se “How the Ocean Works” (Mark Denny, 2008) e foi um dos livros de que mais gostei até hoje. Para já, mostrou-me como eu era ignorante sobre a forma como o mundo funciona. Por causa de uma coisa tão básica como o efeito de Coriollis, os oceanos têm um efeito enorme no clima da Terra. Por exemplo, por que é que os desertos e as florestas tropicais estão onde estão? Tudo começa por causa do efeito de Coriollis, aquele que se vê na água, numa pia. É um livro com alguns capítulos mais técnicos, mas que qualquer pessoa lê facilmente.

Inês Teixeira do Rosário – Agora estou a ler o livro “The Last Child In The Woods” (Richard Louv, 2005), sobre o facto de nas nossas sociedades as crianças desfrutarem menos da natureza, de estarem cada vez mais de costas voltadas para o mundo natural. No fundo, ele diz que, hoje em dia, alguns tipos de problemas nas crianças, como o défice de atenção, estão relacionados com o facto de estas viverem afastadas da natureza.

W – O “Lá Fora” também tenta fazer a ponte entre as pessoas e a natureza…

Maria Dias – O Lá Fora também foi um pouco inspirado no livro inglês, “The Bumper Book of Nature” (Stephen Moss, 2010). Foi uma grande inspiração para nós.

[divider type=”thin”]Venha connosco e com as duas biólogas numa expedição naturalista em Lisboa.

Inês Sequeira

Foi com a vontade de decifrar o que me rodeia e de “traduzir” o mundo que me formei como jornalista e que estou, desde 2022, a fazer um mestrado em Comunicação de Ciência pela Universidade Nova. Comecei a trabalhar em 1998 na secção de Economia do jornal Público, onde estive 14 anos. Fui também colaboradora do Jornal de Negócios e da Lusa. Juntamente com a Helena Geraldes e a Joana Bourgard, ajudei em 2015 a fundar a Wilder, onde finalmente me sinto como “peixe na água”. Aqui escrevo sobre plantas, animais, espécies comuns e raras, descobertas científicas, projectos de conservação, políticas ambientais e pessoas apaixonadas por natureza. Aprendo e partilho algo novo todos os dias.

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