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Estuário do Tejo. Foto: Joana Bourgard/Wilder

ZERO pede uma melhor gestão das zonas húmidas de Portugal

03.02.2025

No Dia Mundial das Zonas Húmidas, que se celebrou a 2 de Fevereiro, a ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável pediu uma melhor gestão das zonas húmidas do país e lembrou que o inventário nacional continua por fazer.

As zonas húmidas são uma “área da política pública de conservação da natureza que continua negligenciada”, segundo esta associação.

Por exemplo, salienta, 13 dos 31 Sítios designados para integrar a Convenção de Ramsar – um tratado intergovernamental assinado em 1971 para conservar as zonas húmidas – não têm plano de gestão nem têm gestão efectiva.

Além disso, não está efetuado o inventário nacional das zonas húmidas.

Entre as maiores dificuldades destas zonas está o aumento da agricultura intensiva nas áreas contíguas, a proliferação das espécies exóticas invasoras, as alterações climáticas e os impactos negativos da pesca ilegal, turismo e recreação.

Para a ZERO, “é particularmente incompreensível a situação da Região Autónoma Madeira que, volvidos mais de 25 anos sobre a designação dos primeiros Sítios Ramsar portugueses – a Ria Formosa e o Estuário do Tejo em 1980 – ainda nem sequer indicou qualquer Sítio para designação no âmbito da Convenção de Ramsar”.

De momento, Portugal tem 31 Sítios designados, 18 no Continente – (119.587 hectares), incluindo o com maior área, o do Estuário do Sado, com 25.588 ha – e 13 na Região Autónoma dos Açores (12.900 ha), inclusive o de menor área, os Ilhéus das Formigas e Recife Dollabarat, com 7 ha.

A associação considera “totalmente incompreensível não ser prioridade a realização do inventário nacional das zonas húmidas, a elaboração de um plano de mitigação dos efeitos das alterações climáticas nas zonas húmidas em geral e na hidrologia dos sítios Ramsar, com particular incidências nas áreas onde a agricultura intensiva tem potencial de contribuir para a degradação dos aquíferos que suportam estes ecossistemas, um plano de ação para a salvaguarda das turfeiras – muito provavelmente o mais ameaçado habitat natural existente em Portugal – e outros habitats de água doce, como os charcos temporários mediterrânicos ou as depressões intradunares”.

Outro dos destaques da ZERO vai para os “impactes negativos dos aproveitamentos hidráulicos” numa altura em que há um movimento para expandir o regadio coletivo de iniciativa estatal em muitos milhares de hectares, através da estratégia “Água que nos une”.

“A drástica alteração dos regimes naturais afeta os caudais ecológicos, impedindo a continuidade dos habitats fluviais e o transporte de sedimentos até aos estuários e zonas costeiras, onde a chegada de água doce é essencial. O valor ecológico destas massas de água artificializadas é muito diminuto e não compensa a perda de zonas húmidas naturais.” 

Segundo a ZERO, a “construção de mais barragens associadas ao regadio não resolve o problema cada vez mais recorrente da severidade das secas meteorológicas (redução temporária da precipitação face ao esperado) e da escassez hídrica (o problema é mais estrutural e resulta do excesso de consumo face às disponibilidades existentes)”. 

“O objetivo parece centrar-se no continuar a alimentar uma procura crescente muito dependente de um regime de precipitação cada vez mais irregular e das limitações da própria evaporação, de afluências que tendem a reduzir-se e do aumento previsível da evapotranspiração das culturas agrícolas em contexto de temperaturas mais elevadas e perante um modelo agrícola industrial totalmente dependente de rega.”

Além disso, em contexto de seca, “há também que ter em conta uma adequada gestão dos aquíferos, uma vez que a maior parte das zonas húmidas estão muito dependentes das massas de água subterrâneas”. 

As zonas húmidas são responsáveis por fornecer quase toda a nossa água doce, garantindo alimentos e recursos fundamentais. O seu solo filtra e armazena a água naturalmente, tornando-as cruciais para a segurança hídrica, especialmente em regiões com precipitação limitada ou irregular.

A biodiversidade das zonas húmidas é impressionante: 40% de todas as espécies conhecidas de animais e plantas vivem e reproduzem-se nesses ecossistemas. Muitas espécies ameaçadas e endémicas dependem exclusivamente desses habitats para sobreviver. 

Além disso, mais de um terço dos vertebrados, quase todos os anfíbios e metade dos peixes utilizam zonas húmidas de água doce. Esses ecossistemas também têm um papel fundamental nas migrações, servindo como locais de descanso, alimentação e reprodução para aves, peixes e outros animais migradores.

Além de fornecer alimentos, água limpa e medicamentos, as zonas húmidas ajudam a proteger contra doenças, garantindo ecossistemas saudáveis. São também uma defesa natural contra desastres, como tempestades, inundações e secas. A sua infraestrutura hídrica natural reduz os impactos de eventos extremos, absorvendo milhões de litros de água de cheia e mitigando os efeitos dos desastres naturais.

Esses ecossistemas armazenam mais carbono do que qualquer outro, desempenhando um papel essencial na estabilização do clima. Ao potenciar a resiliência ambiental, as zonas húmidas ajudam a mitigar as alterações climáticas e a proteger as comunidades. “A sua preservação é fundamental para garantir um futuro sustentável para a humanidade e para todas as formas de vida que delas dependem.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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