Maçarico-rasteirinho, espécie dominante na área de estudo. Foto: José Onofre Monteiro

Estudo alerta que a subida do nível do mar ameaça aves limícolas migratórias

28.02.2025

A subida do nível do mar está a reduzir a disponibilidade de habitat de aves limícolas migratórias no litoral da Amazónia, revela um novo estudo do MARE.

 

Em várias regiões do mundo, as planícies de maré que servem de áreas de alimentação para as aves limícolas durante as suas longas migrações estão a mudar. Este fenómeno põe em risco um elevado número de espécies de aves dependentes de zonas húmidas costeiras, revela um novo estudo publicado na revista científica Environmental Research Letters e liderado pelo investigador do MARE Carlos David Santos.

Área de transgressão marinha. Foto: José Onofre Monteiro

Nem mesmo regiões remotas e prístinas, como o litoral da Amazónia, estão a salvo do impacto humano. Na verdade, este novo estudo revela que a subida do nível do mar está a transformar profundamente as zonas húmidas costeiras da Amazónia brasileira, reduzindo as áreas de alimentação das aves limícolas migratórias. Estas aves, que viajam entre a América do Norte e a América do Sul, dependem das extensas planícies de maré para se alimentarem ao longo das suas rotas.

Os autores do estudo descobriram que as planícies de maré estão a ser gradualmente ocupadas por áreas resultantes de transgressão marinha recente. A transgressão marinha é um fenómeno provocado pela subida do nível médio do mar que leva à migração das zonas húmidas costeiras para o interior. As planícies de maré que resultam da transgressão marinha têm sedimentos demasiado compactos para serem colonizadas por animais invertebrados que servem de alimento às aves limícolas. A equipa de cientistas, composta por investigadores de Portugal e Brasil, utilizou imagens de satélite para mapear a distribuição das planícies de maré ao longo de 40 anos e realizou levantamentos aéreos para contar as aves em 630 quilómetros do litoral da Amazónia.

Os resultados mostram que as aves evitam as planícies de maré resultantes de transgressão marinha, onde a disponibilidade de presas – como pequenos crustáceos – é significativamente menor.

O maçarico-rasteirinho (Calidris pusilla), a espécie dominante na região, apresentou densidades dez vezes inferiores nessas áreas do que nas planícies de maré mais antigas, o que indica um impacto direto na sua alimentação.

Maçarico-rasteirinho, espécie dominante na área de estudo. Foto: José Onofre Monteiro

“Embora a migração das zonas húmidas para o interior seja uma adaptação positiva à subida do nível do mar, as planícies de maré geradas por transgressão marinha não fornecem as condições necessárias à alimentação das aves limícolas, pelo menos no espaço de quatro décadas”, explicou, em comunicado, Carlos David Santos, também investigador do Laboratório Associado ARNET e do Max Planck Institute, e professor na Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade NOVA de Lisboa.

O investigador acrescentou que a subida do nível do mar é um fenómeno global e que este tipo de perda de habitat pode estar em curso em várias regiões do mundo, colocando em risco muitas espécies de aves aquáticas dependentes de zonas húmidas costeiras.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

Don't Miss