Eles trabalharam 40 anos para recuperar espécie extinta na natureza. E conseguiram

28.03.2025

Uma espécie rara de caracol da Polinésia Francesa, o Partula tohiveana, que estava declarado Extinto na Natureza foi alvo de 40 anos de um projecto de conservação. Hoje desceu um nível de ameaça e está Criticamente Em Perigo.

O caracol Partula tohiveana, que desapareceu na natureza por causa da introdução de outras espécies de caracóis carnívoros predadores, foi agora reclassificado na Lista Vermelha da União Internacional de Conservação da Natureza (UICN), passando de Extinto na Natureza para Criticamente Em Perigo.

Indivíduo adulto de Partula tohiveana, nascido nas florestas de Mooreana, em Setembro de 2024. Foto: ZSL

Isto é o resultado de décadas de trabalhos de conservação, coordenados pela Sociedade Zoológica de Londres (ZSL, sigla em Inglês) e dos seus parceiros. Parte deste esforço foi concretizado através de um programa de reprodução na Polinésia Francesa.

Este anúncio é a oficialização de uma descoberta marcante feita no ano passado, quando foram encontrados indivíduos adultos de Partula tohiveana, nascidos na natureza, em Moorea, confirmando que a espécie não apenas conseguia sobreviver mas também reproduzir-se com sucesso no seu habitat natural.

A equipa responsável por este programa de conservação, o mais longo da ZSL, fez reintroduções anuais de caracóis, em colaboração com o Governo da Polinésia Francesa, Universidade de Cambridge e conservacionistas da Sociedade Zoológica de Bristol, Sociedade Zoológica de Detroit e muitas outras entidades.

O programa de reprodução em cativeiro destes caracóis começou nos anos 1980, depois de as suas populações em estado selvagem terem sido dizimadas pela introdução do caracol Euglandina rosea, espécie exótica invasora naquela região e predador do caracol Partula tohiveana.

Uma das especialistas que participou numa reintrodução observa um caracol Partula tohiveana que nasceu na natureza. Foto: ZSL

Os caracóis foram cuidadosamente reproduzidos em cativeiro no Zoológico de Londres e em outros jardins zoológicos um pouco por todo o mundo, antes de grandes quantidades de caracóis serem marcados com tinta reflectora de raios UV e libertados de volta aos seus habitats na floresta da Polinésia Francesa.

“Este é um momento histórico para a Partula tohiveana e para as décadas de trabalho internacional de conservação”, comentou, em comunicado, Paul Pearce-Kelly, curador sénior de Invertebrados do Zoo de Londres e coordenador do programa de conservação dirigido a esta espécie. “Assistir a uma espécie regressar do limiar da extinção, depois de anos de esforços colaborativos é exactamente a razão pela qual fazemos o que fazemos”, acrescentou.

Na opinião deste especialista, a conservação que se faz nos jardins zoológicos vai muito além de manter populações de garantia. “Esta notícia inspiradora mostra o nosso verdadeiro impacto e como estamos a trazer de volta algumas das espécies mais vulneráveis.”

“A resiliência destes caracóis mostra aquilo que podemos alcançar quando conservacionistas, Governos e comunidades locais trabalham juntos para reverter a perda da biodiversidade”, comentou ainda.

Indivíduo adulto de Partula tohiveana, nascido nas florestas de Mooreana, em Setembro de 2024. Foto: ZSL

Os caracóis do género Partula representam um género de caracóis terrestres tropicais, especialmente adaptados a viver em diferentes vales vulcânicos na Polinésia Francesa e outras ilhas do Pacífico. O género tem hoje 104 espécies descritas para a Ciência, das quais 15 espécies e sub-espécies são alvo de programas de reprodução em cativeiro.

Outrora abundantes naquelas ilhas, muitas espécies deste género desapareceram nos anos 1980 e início dos anos 1990 depois de ter sido introduzido um caracol carnívoro para controlar uma outra espécie de caracol exótica, o caracol Lissachatina fulica.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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