Em meados de Abril, a Primavera vai dando lugar ao Verão e vou em direção ao Parque do Tejo Internacional.
Os abelharucos pousam nos fios das vedações e os matos intensamente floridos formam mosaicos de rosmaninho e giesta. Na minha frente passa o amarelo vibrante do papa-figos (Oriolus oriolus), que não é assim tão fácil de avistar. O seu canto soa a ave exótica. Não é chilreado nem melódico, antes uma “flauta” não muito afinada que se repete por cadências.
Caminhar pelos estevais altos de Idanha é como desbravar capim e as folhas pegajosas da esteva parecem agarrar-me as roupas e as mãos. São inúmeros os polinizadores, entre himenópteros (abelhas e afins) e coleópteros (escaravelhos) que circulam entre as flores grandes, brancas e frágeis. No céu, a voar em círculos, os grifos (Gyps fulvus) e um casal de milhafres negros (Milvus nigraus).
Mais à frente as copas das azinheiras tocam a vegetação arbustiva num emaranhado muito favorável aos javalis e veados. Na sombra, sento-me perto de um tronco já parcialmente consumido por fungos decompositores e perfurado por longas galerias de larvas de capricórnio (Cerambix cerdo), um notável coleóptero/escaravelho que pode atingir os 10 cm de comprimento.
Continuei no sentido do troço fronteiriço do Rio Tejo para entrar dentro dos limites do parque.
Tomando caminhos inóspitos ladeados por muros de pedra, fui ao encontro dos vales de azinheiras. No percurso observei as cotovias (Galerida cristata) e demorei-me nos sons do seu canto articulado, agudo e ágil.
A maior diversidade de aves encontra-se nos corredores ripícolas (corredor de copas mais ou menos fechado sobre um curso de água) mas igualmente em matagais e zambujais (oliveiras-bravas).
No céu é frequente a presença de aves de rapina de grande porte que, por vezes, descem a níveis mais baixos para se certificarem da presença de alimento.
Mas enquanto tento diferenciar espécies de pequenos aracnídeos presentes nos musgos secos, dois caminhantes aproximam-se e fazem-me perguntas sobre aquele trilho. Na conversa comentam com excitação a observação de uma doninha que espreitava da cavidade de uma árvore. “Era um bicho de corpo comprido e delgado com focinho aguçado “, dizia um e lá foram consultando o guia na esperança de poderem assinalar mais espécies.
A biodiversidade de aves no Tejo Internacional é elevada, assim como a das plantas. É muito interessante encontrar, subitamente, bocas-de-lobo (Antirrhinum graniticum), cravina brava (Dianthus lusitanus), rosa-albardeira e lírios-dos-montes (Iris lusitanica).
Os caminhos que faço entre o Rosmaninhal e Segura não são por estrada nacional. A montante o rio Erges passa por Salvaterra do Extremo. Existe um açude que faz de corredor para o país vizinho, mas a natureza impede esse canal de comunicação…
No caminho para Segura, vou até à ponte romana construída no sec. II e de onde se avista as margens do Erges. De um lado Portugal, do outro Espanha. Metade da ponte para cada um. O rio não mostra fronteiras nas águas esverdeadas, quase paradas, nem nas plataformas rochosas onde grifos e abutres do Egito (Neophrum percnopterus) nidificam.
Desço pela encosta do “lado português”, até perto de água. Num pequeno banco de areia sento-me para dar lugar a momentos mais contemplativos. Não se vê ninguém. Um pouco mais acima, nos meandros da margem, há registos de observações de lontras. Olho demoradamente pensando que possa ter sorte. É pouco provável avistá-las a esta hora da tarde.
Maio já pode ser muito quente na Beira Baixa….e do outro lado das escarpas nidificam os abutres-do-Egipto, aves rupícolas que, como a cegonha-preta, ocupam pequenos enclaves na rocha.
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Luísa Ferreira Nunes está a fazer uma expedição pela Beira Baixa, até ao final do ano. À procura de tesouros naturais que regista em texto, desenho, fotografia e vídeo. Acompanhe as suas viagens aqui na Wilder.