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Ilustração representativa de Gaiasia jennyae (à esquerda). Ilustração: Gabriel Lio. Fóssil de Gaiasia jennyae. Foto: Claudia Marsicano

Criatura parecida a salamandra gigante foi um predador de topo antes dos dinossauros

05.07.2024

Quarenta milhões de anos antes dos primeiros dinossauros, um feroz predador vivia em águas pantanosas. Era maior do que um ser humano. Conheça o Gaiasia jennyae, espécie descrita agora para a Ciência a partir de fósseis encontrados na Namíbia.

Gaiasia jennyae era consideravelmente maior do que uma pessoa e provavelmente viveria no fundo de lagos e de pantânos”, disse, em comunicado, Jason Pardo, investigador no Field Museum em Chicago, Estados Unidos, e co-autor do artigo publicado na revista “Nature” com a descrição da nova espécie. “Tinha uma cabeça grande, achatada, que lhe permitia abrir a sua boca e engolir as presas. Tinha dentes grandes, toda a parte da frente da sua boca tinha dentes gigantes”, acrescentou.

O fóssil ganhou o nome por causa de Gai-as, local na Namíbia onde foi encontrado, e de Jenny Clack, uma paleontóloga que se especializou na evolução dos primeiros tetrápodes, os vertebrados de quatro membros que deram origem aos anfíbios, répteis, aves e mamíferos.

Foi a investigadora Claudia Marsicano e a sua equipa da Universidade de Buenos Aires, Argentina, que descobriram os fósseis. 

“Quando encontrámos este enorme espécime foi um choque. Soube só de o ver que era algo completamente diferente. Ficámos todos muito entusiasmados”, comentou, em comunicado, Marsicano, co-autora do estudo.

“Depois de estudarmos o crânio, a estrutura frontal chamou a minha atenção. Na altura era a única parte visível e tinha dentes muito grandes e inter-espaçados entre si, criando uma mordedura única para os primeiros tetrápodes”, acrescentou a investigadora.

Mais tarde, a equipa descobriu vários espécimes, incluindo um com um crânio e coluna bem preservados. “Tínhamos material verdadeiramente fantástico, incluindo um crânio completo, que podíamos usar para comparar com outros animais daquela época e perceber o que era este animal e o que o tornava único”, comentou Pardo. Acabou por ser uma criatura muito especial.

Hoje, a Namíbia localiza-se a Norte da África do Sul. Mas há 300 milhões de anos ficava ainda mais a Sul. Ficava perto do paralelo 60º, quase ao mesmo nível da ponta mais a Norte daquilo que hoje é a Antárctida. E naquela altura, a Terra estava quase a chegar ao fim de uma Idade do Gelo. As terras pantanosas perto do equador estavam a secar e a tornar-se mais florestadas mas perto dos pólos, os pântanos continuavam a existir, eventualmente perto de zonas de gelo e glaciares.

Nas regiões mais quentes e secas do mundo, os animais estavam a evoluir para novas formas. Os primeiros vertebrados de quatro pernas, chamados tetrápodes, dividiram-se em várias linhagens que se iriam tornar em mamíferos, répteis e anfíbios. Mas nas franjas, em locais como o que hoje é a Namíbia, continuavam a existir formas mais antigas.

“É mesmo, mesmo surpreendente que Gaiasia seja tão arcaico. Estava relacionado com organismos que se terão extinguido 40 milhões de anos antes”, sublinhou Pardo.

Ainda assim, parecia estar a dar-se mesmo muito bem. “Existiam outros animais mais arcaicos ainda a sobreviver há 300 milhões de anos, mas eram raros e pequenos”, explicou o investigador. “Gaiasia era grande e abundante e parecia ser o principal predador no seu ecossistema.”

Apesar de Gaiasia jennyae ser apenas uma espécie, dá informação preciosa aos paleontólogos que estudam como o mundo estava a mudar naquele período. “Diz-nos que o que estava a acontecer no Sul era muito diferente daquilo que estava a acontecer no equador. E isso é mesmo importante porque havia muitos grupos de animais que apareceram naquela altura que não sabemos de onde vieram”, comentou Pardo. “O facto de termos encontrado Gaiasia tão a Sul diz-nos que havia um ecossistema rico que conseguia suportar estes grandes predadores. Se estudarmos mais poderemos encontrar mais respostas sobre estes grandes animais, antepassados dos mamíferos e répteis modernos.”

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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