As dunas não devem ser como divãs, passeios ou parques de estacionamento. O projeto ReDuna traz à praia da Cova do Vapor, em Almada, a oportunidade de reforçar o cordão dunar com a ajuda de voluntários na plantação de estorno.
O dia começou às 10h no ponto de encontro marcado: o parque de estacionamento da praia da Cova do Vapor. O grupo ainda é tímido, apenas dois voluntários do grupo da Brigada do Mar (repetentes nestas andanças), Patrícia Silva e Mário Estevens da Câmara Municipal de Almada, e uma família do grupo dos Tubarões, a equipa de rugby da Costa da Caparica. É um dia frio de Dezembro e a noite foi chuvosa. No entanto, a ação vai decorrer na mesma com o objetivo de ser mote à sensibilização da população do bairro da Cova do Vapor para a proteção das dunas.
Depois de uma breve explicação sobre a relevância das dunas e o seu papel crucial na proteção da costa contra a erosão do mar, os voluntários foram buscar diversas mudas da planta de estorno (Ammophila arenaria) para serem plantadas nas zonas delimitadas da área dunar. Esta planta autóctone é fundamental na duna e, apesar de parecer bastante frágil quando jovem, em adulta as suas raízes podem atingir metros de profundidade, criando redes que permitem a retenção de areias e a sua propagação pela duna.
Patrícia Silva, da Câmara Municipal de Almada, mostra como fazer: abrir um pequeno buraco com as mãos, de modo a chegar à areia mais molhada, mas não demasiado fundo. Após colocar a planta, esta deverá ser tapada com areia molhada e feito um pequeno monte de areia junto ao caule que ajudará a reter água. Junto à planta, a areia deverá ser pressionada, de forma a diminuir o ar junto das raízes. Os voluntários dividem-se e a ação começa. Apesar do frio que se faz sentir, as plantações avançam a todo o vapor. Às 10h45, a primeira moradora do bairro junta-se ao grupo. Apesar de este ser um grupo pequeno, rapidamente as várias plantas começam a encher as zonas delimitadas pela paliçada de ramos de salgueiro.
“Temos tido residentes da Cova do Vapor que se têm envolvido ao longo dos anos nas várias fases do projeto”, conta Mário Estevens, colaborador da Câmara Municipal de Almada, referindo-se a uma iniciativa que começou em 2015. “Têm o interesse particular de querer que a zona seja mais ou menos gerida e controlada e que as areias não sejam tão móveis porque este é um dos problemas que eles enfrentam”, explicou. Segundo Mário Estevens, os moradores estão mais envolvidos “na fase de instalação de vedações e produção e colocação de sinalética”. Este projeto já contou inclusive com a participação de grupos de alunos vindos do estrangeiro que integraram este projeto em cursos de verão na área da ecologia.
O sol começa a romper e são 11h30. Duas zonas já estão preenchidas com plantas de estorno que, como conta Patrícia, são “filhas aqui da duna”. As dúvidas vão surgindo: “Como é a semente?”, pergunta um voluntário que, entretanto, se juntou. “Quando elas estão grandes, sai uma espiga grande amarela, cortamos essas espigas todas para dentro de um saco que depois é sacudido, à moda antiga do centeio e da cevada”, responde Patrícia. Mário Estevens acrescenta ainda: “A vantagem desta planta é que como ela está adaptada à duna, à medida que for juntando areia, e ela for sendo subterrada, mais depressa vai crescendo”, reforçando a robustez do estorno.
Em Portugal são vários os projetos, atuais ou já passados, que visam a restituição do cordão dunar ao longo da costa e vários os municípios que reconhecem essa necessidade. O município de Vagos, em Aveiro, levou a cabo em 2021 uma atividade de replantação de estorno na praia do Areão, com as escolas do município.
A Câmara Municipal de Gaia também promove – através do seu website, centro interpretativo e passadiços sobre as dunas – a literacia sobre flora e fauna características das dunas de Aguda. “Esta autêntica mini-reserva serve de local de nidificação para as aves, bem como de centro de educação ambiental para os fenómenos de erosão costeira”, pode ler-se no website institucional.
Em Leiria, o principal foco tem sido a remoção do chorão das praias (Carpobrotus edulis), planta exótica invasora que não permite o crescimento e diversidade de flora necessários para a manutenção do cordão dunar.
Mais a sul, em Portimão, o município dinamiza visitas de estudo às dunas da praia do Alvor, com o objetivo de “compreender a importância dum sistema dunar bem preservado”.
O sol apareceu finalmente e é meio-dia. O estorno que havia disponível foi plantado de forma bastante visível a quem por ali passe. O objetivo de ser plantado perto do passadiço, e em grande quantidade, é também esse: que a população da Cova do Vapor compreenda os esforços que estão a ser feitos e se sinta também responsável pela preservação da duna que protege as suas casas na subida do mar. Este é um esforço que tem de ser comum às entidades públicas mas também aos residentes.
Nina, de 8 anos, repetente em ações de preservação, afirma com orgulho: “Já tirei chorão, plantei estorno e recolhi sementes”. Para ela, cuidar das dunas é tão natural como jogar rugby, mas Cristina Oppermann, a sua mãe, também presente na ação, relembra que é também papel dos pais e educadores fomentar o sentimento de cuidado e preservação, e dar o exemplo às gerações vindouras. “Desde muito pequena que tentamos fazer com que ela perceba que ela faz parte da natureza. Se ela não cuidar, o mal é para ela também”.
O projeto ReDuna
As dunas são barreiras físicas importantes, dinâmicas, que se constroem e movimentam a partir de sedimentos depositados pelo vento. Muitas estão em risco devido ao avanço da linha do mar. Para além de proteção à povoação residente na linha de costa, constituem também um local de biodiversidade importante, quer seja de espécies de flora como o estorno (Ammophila arenaria), a morganheira-da-praia (Euphorbia paralias), o cardo-marítimo (Eryngium maritimum) ou a luzerna-da-praia (Medicago marina); como de fauna, onde se podem encontrar, dependendo do local, libélulas, grilos, escaravelhos, anfíbios, répteis e aves.
O projeto ReDuna, que está a ser implementado nas praias da Costa da Caparica, “visa promover a restauração ecológica e a recuperação do sistema dunar das praias do concelho de Almada, aumentando a capacidade de retenção das areias e tornando o cordão dunar mais resistente à erosão provocada pelo vento e pelo mar”, como explica a Câmara Municipal de Almada. Este projeto teve início em 2015 e hoje está na sua segunda fase, que visa “a expansão desta eficaz metodologia de restauro dunar à área da Cova do Vapor, uma zona com o cordão dunar muito fragilizado e em elevado risco de erosão e galgamento”. Parte crucial do projeto passa por envolver a população que vive perto da zona dunar no processo de recuperação e manutenção das zonas de pisoteio. A recuperação das dunas só é bem-sucedida se a população compreender a necessidade da sua preservação.
Agora é a sua vez.
Saiba aqui como pode ajudar na recuperação ecológica destas dunas. A próxima acção de voluntariado acontece a 25 de Fevereiro, das 10h00 às 12h30.