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Gonçalo Ribeiro Telles. Foto: Câmara Municipal de Lisboa

Morreu Gonçalo Ribeiro Telles, o defensor da natureza urbana

11.11.2020

Gonçalo Ribeiro Telles, que inspirou gerações de arquitectos paisagistas e que sempre defendeu a natureza nas cidades – através de jardins, parques naturais ou hortas urbanas – morreu hoje aos 98 anos.

Uma das grande obras de Gonçalo Ribeiro Telles foi o Jardim da Fundação Calouste Gulbenkian, na cidade de Lisboa. Hoje, o Conselho de Administração da Fundação expressou o seu “profundo pesar” pelo desaparecimento de “uma figura ímpar”, segundo um comunicado.

Isabel Mota, presidente da Fundação, lembra “o amigo e visionário (…) responsável, em conjunto com António Viana Barreto, pelo desenho do jardim da Fundação Gulbenkian, um espaço que se tornou emblemático para todos os que diariamente aqui esquecem o bulício da cidade”.

A presidente da Fundação considera Gonçalo Ribeiro Telles um  “incansável defensor das cidades ecológicas e humanizadas, das reservas e parques naturais, dos jardins e das hortas urbanas, perante a ameaça constante dos interesses privados e corporativos”.

Nascido em 1922, Gonçalo Ribeiro Telles formou-se em Agronomia e Arquitetura Paisagista em 1950, no Instituto Superior de Agronomia.

Ao longo da vida desempenhou vários cargos políticos. Entre 1974 e 1976 foi subsecretário de Estado do Ambiente e secretário de Estado de Ambiente. Anos mais tarde, de 1981 a 1983 desempenhou as funções de Ministro da Qualidade de Vida.

Da sua passagem pelo Governo nasceu um conjunto de decretos-lei que foi determinante para a definição de uma política de ambiente e de paisagem, destacando-se a Reserva Agrícola Nacional e a Reserva Ecológica Nacional.

Enquanto deputado na Assembleia da República são da sua responsabilidade as propostas da Lei de Bases do Ambiente, da Lei da Regionalização, da Lei Condicionante da Plantação de Eucaliptos, da Lei dos Baldios, da Lei da Caça e da Lei do Impacte Ambiental.

Em 1985 foi vereador da Câmara Municipal de Lisboa pelo Movimento da Terra. Enquanto esteve no cargo criou o Parque Periférico de Lisboa, esteve por detrás do Corredor Verde de Ligação do Alto do Parque Eduardo VII ao Parque Florestal de Monsanto e da Proposta de Estudo de uma Estrutura Biofísica e Cultural para o Concelho de Lisboa.

Para José Sá Fernandes, vereador do Ambiente, Estrutura Verde, Clima e Energia da Câmara Municipal de Lisboa, Gonçalo Ribeiro Telles foi um “mester da Paisagem” e “um homem de uma enorme sabedoria”.

Uma das suas maiores lutas, sublinha o vereador “é aquele continuum naturale que nos leva da Avenida da Liberdade até Monsanto, interceptado por um Vale de Alcântara, submerso em auto-estradas e linhas de caminho-de-ferro, mas cujo projecto idealizado é feito para as pessoas poderem utilizar esse  “impossível” e também para unir bairros – o Bairro da Liberdade à Bela Flor – e fazer ligações óbvias, como a de Campolide até ao rio, passando por debaixo do Aqueduto das Águas Livres”.

“Desta necessidade de humanizar aqueles terrenos, para salvaguardar as linhas de água, as brisas, aumentar a biodiversidade, para que se percebesse que  o planeamento não se deve fazer por zonas, mas por sistemas ecológicos, num equilíbrio dinâmico, feito pelo homem e para o homem, resulta, sem dúvida, uma das marcas de agora e de toda esta área de Lisboa.”

Alguns dos pilares do pensamento de Gonçalo Ribeiro Telles são a importância da árvore, a agricultura urbana, o produzir perto do consumo, ligar o campo e a cidade.

Também deixou a sua marca no ensino. Em 1975 ajuda a fundar o curso de Planeamento Biofísico que, em 1981, se transformaria na licenciatura em Arquitetura Paisagista da Universidade de Évora. Naquela instituição foi Professor Catedrático, entre 1976 e 1992, depois Professor Emérito e recebeu, em 1994, o grau de Doutor Honoris Causa.

A nível nacional foi agraciado com o Grau de Oficial da Ordem Militar de Sant’Iago (1969), Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo (1988), Grã-Cruz da Ordem da Liberdade (1990).

Enquanto profissional liberal desenvolveu um conjunto de projetos a várias escalas da paisagem: jardins privados e públicos, parques públicos, corredores verdes, implantação de rodovias, recuperação de pedreiras, recuperação de quintas de recreio, integração paisagística de unidades fabris, ordenamento rural e do território.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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