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O melhor da Primavera: os peixes que guardam os seus ovos nas praias da Arrábida

26.03.2020

Apesar de muitas coisas terem parado por estes dias, a Primavera continua lá fora. Tal como todos os anos, estes pequenos peixes começaram a fazer as posturas em ninhos nas rochas das praias da Arrábida.

 

Na zona costeira da Arrábida, este é um tempo de extrema importância para peixes litorais como os cabozes (Blenios e Gobius). Chegou a altura da reprodução anual e da postura de ovos.

Para isso, estes peixes com ventosas (para se agarrarem às pedras) escolhem os ninhos em fendas nas rochas ou debaixo de pedras à beira-mar, na zona entre-marés.

Os peixes sugadores (Lepadogaster lepadogaster) da Arrábida estão a ser acompanhados desde Setembro de 2019 por Inês Matado, estudante finalista de biologia da Universidade Lusófona, no âmbito da disciplina de Projecto.

 

Adulto de peixe sugador. Foto: Bernardo Gouveia

 

“A ideia é comparar épocas de postura com dados que eu e alguns colegas temos de há 20 anos para o mesmo local para ver se existem ou não variações”, explicou Gonçalo Calado, biólogo, investigador associado do Instituto Português de Malacologia (IPM) e professor na Universidade Lusófona à Wilder. Mas ainda não há resultados.

Gonçalo e Inês estiveram esta semana numa das praias da Arrábida e encontraram o primeiro ninho de peixe sugador do ano. “Os dados que temos de ninhos de Lepadogaster lepadogaster na Arrábida vão de Março a Agosto. Este foi o primeiro que encontrámos este ano.”

A Primavera é a estação eleita para a postura dos ovos, por existirem mais recursos. “Ainda assim, há espécies que, porque evoluíram em sítios de temperaturas e latitudes diferentes quando expandiram a sua distribuição, adaptaram a época de reprodução às temperaturas a que estavam habituadas e podem, por exemplo, fazer posturas no Inverno mais a Sul e no Verão mais a Norte, isto no hemisfério norte.”

Por estes dias, “os machos dos peixes-ventosa da espécie Lepadogaster lepadogaster vestem as suas roupas mais garridas de forma a chamar as fêmeas para pôr ovos no seu ninho”, explica o biólogo.

Isto acontece um pouco por toda a zona litoral de Portugal. Mas as zonas de muito hidrodinamismo e/ou com muita areia têm menos espécies.

“Estes peixes fazem posturas na zona costeira, desde a zona entre-marés até à parte sublitoral. Mas vai depender das espécies”, disse Gonçalo Calado. Essas zonas são escolhidas por terem, muitas vezes, locais bons de abrigo e por serem muito produtivas.

 

A primeira postura de peixe sugador que os biólogos encontraram este ano, numa praia da Arrábida. Foto: Gonçalo Calado

 

“A regra é o macho guardar o ninho, atraindo fêmeas para lá depositarem os ovos que por ele serão fecundados.” Os machos ficam a cuidar do ninho limpando-o e arejando-o durante a época de reprodução.

“É frequente ver posturas com ovos em distintos estados de desenvolvimento, provenientes de fêmeas diferentes. Mas pelo que conheço das nossas costas, o período de desenvolvimento de cada ovo é de algumas semanas e o macho pode ficar alguns meses (dois, três, quatro) no ninho. Mas, novamente, depende das espécies.”

Ainda há muito por descobrir sobre estes pequenos animais que põem os seus ovos nas praias da Arrábida.

Por enquanto, Gonçalo Calado diz que vão “tentar manter as saídas quinzenais dentro dos constrangimentos do estado de emergência” que o país vive. A ideia é continuar a estudar a espécie, mantendo um trabalho a longo prazo com os seus alunos.

 

[divider type=”thick”]Saiba mais.

Descubra aqui uma outra espécie de peixe litoral que também põe os seus ovos em ninhos na zona entre-marés, desta vez, na Praia das Avencas, em Cascais.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.

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