Papagaio-do-mar (Fratercula arctica). Foto: Richard Bartz/Wiki Commons

Criada área protegida no Atlântico que é um hotspot para aves marinhas ameaçadas

Com quase 600 mil quilómetros quadrados em águas internacionais ao largo dos Açores, a nova Área Marinha Protegida da Corrente do Atlântico e da bacia do monte submarino Evlanov, cuja criação foi aprovada a 1 de Outubro, é considerada vital para as aves marinhas.

Esta nova Área Marinha Protegida (AMP) foi aprovada durante a conferência das Partes da Convenção OSPAR para a proteção marinha no Nordeste Atlântico que aconteceu a 1 de Outubro no Palácio da Cidadela, em Cascais.

Os governantes e representantes de 15 países – Alemanha, Bélgica, Dinamarca, Espanha, Finlândia, França, Irlanda, Islândia, Luxemburgo, Noruega, Países Baixos, Portugal, Reino Unido, Suécia, Suíça – e da União Europeia decidiram aprovar esta AMP que vai proteger “uma área de importância vital para a alimentação de aves marinhas”, segundo um comunicado do Ministério do Mar.

A área da NACES (Área Marinha Protegida da Corrente do Atlântico e da bacia do monte submarino Evlanov) é maior do que o Reino Unido e a Alemanha juntos, com os seus 595.196 quilómetros quadrados.

Nos últimos 50 anos, as aves marinhas registaram declínios de 70% a nível mundial e hoje são o grupo de aves mais ameaçado do planeta. Cinco espécies globalmente ameaçadas dependem desta nova AMP para a sua sobrevivência: a freira-das-Bermudas (Pterodroma cahow), a freira-da-Madeira (Pterodroma madeira), a freira-do-bugio (Pterodroma deserta), a gaivota-tridáctila (Rissa tridactyla) e o papagaio-do-mar (Fratercula arctica). Estas aves estão classificadas como Vulneráveis e têm populações que estão em rápido declínio.

“Com base em dados de rastreio comprovou-se que a área é utilizada por aves marinhas, que se reproduzem nas costas do Atlântico Nordeste, e por aves migratórias que nidificam noutras partes do mundo”, segundo o Ministério do Mar.

Na verdade, este santuário para aves marinhas foi descoberto graças a um esforço internacional de várias organizações, coordenadas pela federação Birdlife International. “Usando dados de seguimento, fenologia e populacionais, a BirdLife mapeou a abundância e diversidade de 21 espécies de aves marinhas”, explicou esta federação em comunicado.

Aquele hotspot é utilizado anualmente por entre 2,9 a cinco milhões de aves marinhas de mais de 56 colónias dispersas pelo Atlântico Norte e Sul, fazendo desta uma das mais importantes concentrações de aves marinhas migradoras no Atlântico. “Foi a primeira descoberta registada até agora de concentrações de aves marinhas desta magnitude em alto mar”.

Papagaio-do-mar (Fratercula arctica). Foto: Richard Bartz/WikiCommons

Além disso, os fundos marinhos desta AMP albergam uma vasta variedade de biótopos e de elementos batimétricos, como as planícies abissais, os canhões e os montes submarinos.

Durante o encontro foi ainda aprovada a nova Estratégia Ambiental do Atlântico Nordeste até 2030 para travar os impactos das alterações climáticas, perda da biodiversidade, acidificação e poluição nos ecossistemas marinhos.

As cinco Regiões do Nordeste Atlântico abrangidas são as Águas do Ártico, O Grande Mar do Norte, os Mares Celtas, o Golfo da Biscaia e a Costa Ibérica e o Atlântico Extremo). 

Aquela Estratégia vai classificar como protegida 30% da Área Marítima OSPAR até 2030. Além disso, pretende proteger “importantes habitats florestais de algas que sequestram CO2 produzido pelas atividades humanas” e reduzir a poluição, incluindo por plásticos, em 50% até 2025 e em 75% até 2030.

Os ministros presentes em Cascais decidiram também avançar com normas de prevenção e esquemas de certificação para toda a cadeia de abastecimento de plástico, para combater a disseminação de granulados de plásticos de origem industrial no ambiente marinho.

Recentemente, a 10 de Setembro, foi publicado o Guia de Áreas Marinhas Protegidas (MPA Guide, em Inglês) por uma equipa internacional de 42 investigadores num artigo na revista Science. Este trabalho, resultado de 10 anos de trabalho, faz o ponto de situação das áreas marinhas protegidas no planeta.

Hoje, só 3% do oceano está totalmente protegido; a meta é chegar a 2030 com 30%. Disponível para todos neste site, o Guia, que teve o apoio também da Fundação Oceano Azul, mostra o que estamos mesmo a conseguir conservar, o que não funciona e o que é preciso fazer para ter sucesso.


Saiba mais.

Recorde aqui a entrevista a Emanuel Gonçalves, um dos investigadores que publicou o Guia de Áreas Marinhas Protegidas e administrador e coordenador científico da Fundação Oceano Azul.

Helena Geraldes

Sou jornalista de Natureza na revista Wilder. Escrevo sobre Ambiente e Biodiversidade desde 1998 e trabalhei nas redacções da revista Fórum Ambiente e do jornal PÚBLICO. Neste último estive 13 anos à frente do site de Ambiente deste diário, o Ecosfera. Em 2015 lancei a Wilder, com as minhas colegas jornalistas Inês Sequeira e Joana Bourgard, para dar voz a quem se dedica a proteger ou a estudar a natureza mas também às espécies raras, ameaçadas ou àquelas de que (quase) ninguém fala. Na verdade, isso é algo que quero fazer desde que ainda em criança vi um documentário de vida selvagem que passava aos domingos na televisão e que me fez decidir o rumo que queria seguir. Já lá vão uns anos, portanto. Desde então tenho-me dedicado a escrever sobre linces, morcegos, abutres, peixes mas também sobre conservacionistas e cidadãos apaixonados pela natureza, que querem fazer parte de uma comunidade. Trabalho todos os dias para que a Wilder seja esse lugar no mundo.